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Fanática por futebol adere a torcida organizada
Superar preconceitos, enfrentar banheiros sujos e até encarar brigas, vale tudo pelo time do coração
ADRIANA KÜCHLER
DA REVISTA DA FOLHA
Mãos para o alto e pernas
abertas. Nessa posição, 12 torcedoras do São Paulo tiveram
de ser revistadas pela Polícia
Militar antes de chegar à Vila
Belmiro para assistir ao clássico contra o Santos no último
domingo. Cinco minutos depois da situação humilhante,
elas vibravam no estádio. O jogo era mais importante.
Assim como elas, outras centenas estarão hoje, Dia da Mulher, acompanhando outro
clássico, Palmeiras e Corinthians, não pela TV, mas dentro
das torcidas organizadas.
É difícil quantificar o crescimento da presença das mulheres nos antigos redutos masculinos. Hoje, estima-se que elas
representem cerca de 5% do
contingente das organizadas.
Elas tentam se igualar a eles
indo aos jogos, viajando atrás
do time, gritando, xingando e às
vezes se metendo em confusões. Mas também têm de enfrentar as tais revistas constrangedoras, banheiros imundos e restrições impostas por
eles, que chegaram primeiro.
Quem manda na torcida são
os machos. Eles decidem em
que caravanas as meninas podem ir. "A gente respeita. Mulher não tem vez", diz Priscila
Bernardino, 25, que frequenta,
desde 1994, a Gaviões da Fiel,
organizada do Corinthians.
"Antes, nem deixavam a gente
ir a clássico", diz Érika Papangelacos, 27, 15 anos de Gaviões.
O machismo ainda marca
presença nas torcidas. Apesar
da crescente presença das mulheres, elas não participam da
direção. Mas, pouco a pouco,
vêm ganhando voz. "Muito homem não aceita que mulher
possa gostar de futebol sem ser
para ver perna de jogador", diz
Amanda de Oliveira, 20, do
Bonde Feminino, ala de meninas da Dragões da Real, organizada do São Paulo.
Ela explica que só ganham
respeito depois que demonstram entender de futebol.
Reproduzir certas características do comportamento masculino é uma tendência entre as
integrantes de torcidas organizadas. "Há até cinco anos, era
possível observar que as mulheres só eram bem aceitas nas
torcidas se tivessem um comportamento semelhante ao
masculino", diz Heloisa Reis,
ex-jogadora e professora da
Unicamp que pesquisa os aspectos sociais do futebol.
De uns anos para cá, com a
criação do Estatuto do Torcedor, destaca ela, cresceu nos estádios a presença não só de mulheres mas das esposas e filhas.
Nos anos 1910 e 1920, elas frequentavam jogos de futebol como eventos sociais. Os estádios
eram dos poucos lugares em
que as mulheres podiam se expor socialmente, diz Leda Maria da Costa, pesquisadora vascaína, autora do estudo "Lugar
de Mulher É na Arquibancada".
Mas, com a popularização do
esporte, a imagem do glamour
feminino desapareceu.
Excesso de feminilidade
Sempre preocupadas em
manter a "postura", as integrantes das organizadas vivem
na corda bamba para não despencar no excesso de feminilidade. O medo: parecer uma maria-chuteira ou maria-torcida.
"Elas mal entram na organizada e já tão "pegando" um
monte", diz Amanda. "Conversa do jogo elas não entendem
nada." Segundo as torcedoras
autênticas, as marias são aquelas que vêm de saia e salto e só
querem saber de festa. Para as
"organizadas", as marias-torcida não sobrevivem até o segundo tempo. Mudam de time
quando trocam de namorado.
Preconceito às avessas
Há quem incentive a presença das mulheres no ambiente
esportivo como um estímulo à
redução da violência. A polêmica teoria é defendida pelo britânico Eric Dunning, pioneiro em
estudos de sociologia do esporte. "Esse é um preconceito às
avessas, ancorado no estereótipo de mulher passiva e frágil",
diz a pesquisadora Leda.
Não há sinal de passividade
quando a torcida rival entra em
campo. No encontro que a Folha promoveu entre uma integrante da Gaviões e outra da
Dragões, a corintiana afirmou
que não participaria com uma
torcedora da Independente,
outra organizada do São Paulo.
Há torcedoras que se metem
em briga por querer. "É a mina-mano", diz Priscila. "Azar o dela, que se acha mulher-maravilha. Que apanhe de homem."
Elas também dispensam a
solidariedade entre mulheres.
Se vê uma garota de outra torcida em má situação, Priscila é
categórica: "Passo reto". Para
Amanda, a regra é clara. "Quando você vai a um clássico, sabe o
perigo que está correndo."
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