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DANUZA LEÃO
Considerações sobre Severino
Conheci há uns dias o presidente da Câmara, Severino
Cavalcanti, e formei umas opiniões sobre ele. É natural: sempre
que se conhece uma pessoa se
"acha" alguma coisa dela.
Severino é simpático. Parece ser
alguém que mora no mato e que,
quando aparece de vez em quando para fazer uma visita, sua chegada deve ser sempre uma alegria; por ser rude, mais velho e viver à margem da civilização,
acha e fala o que quer, e todo
mundo morre de rir. Uma figura
folclórica, digamos.
Não é um homem mau: está
sempre pronto a ajudar, seja dando dinheiro a quem precisa de um
remédio (deve tirar as notas do
bolso sem nem contar quanto está
dando), uma dentadura, um burro para puxar uma carroça.
Deve também fazer o que pode
para arranjar uma "colocação"
para um afilhado ou uma vaga
na escola para uma criança, e como faz muitos favores, tem sempre a quem recorrer para dar
uma driblada na lei, o que acha
muito natural. Por dizer o que
pensa, muitos acham que Severino é legal: não é hipócrita e faz o
que todo mundo faz, só que não
esconde.
Vide o que ele fez por seu amigo,
o deputado Carimbão (contado
por ele): forçou um convite para
levá-lo ao jantar na embaixada
do Brasil na Itália, conseguiu
apresentá-lo ao presidente Lula, e
mais: que ele voltasse ao Brasil no
avião presidencial. Algum dia
Carimbão vai negar alguma coisa
a Severino? É claro que não.
Emprega parentes e amigos
com excelentes salários, e no passado chegou a ter 14 lojas; de tanto fazer o bem, perdeu todas e
ainda gastou toda a herança de
sua mulher. Mas foi compensado
tendo sido eleito várias vezes;
quanto mais favores fizer, mais
certo é que vai continuar ganhando as eleições: o povo é grato a
quem o ajuda.
Só existe um pequeno porém: o
que fazia com o seu próprio dinheiro -por isso perdeu tudo e é
deputado há tanto tempo, mas
valeu- agora faz, sem a menor
cerimônia, com o dinheiro da nação -e com o prestígio que adquiriu a partir dos seus favores.
Na sabatina da Folha, na última segunda-feira, soubemos
(contado por ele) que havia sido
escolhida uma delegação de seis
deputadas para uma reunião na
ONU, mas quando ele viu os nomes, se recusou a assinar a autorização. A razão? Porque, segundo ele, todas aquelas deputadas já
haviam viajado ao exterior. Foram então escolhidas seis outras,
por um critério seu, aliás muito
humano: elas nunca haviam saído do país. Algum dia essas seis
deputadas vão deixar de votar no
que Severino pedir ou mandar?
Nunca.
Dentro da Câmara, quem é
amigo dele é amigo do rei. Mas o
Brasil não é o quintal da casa de
Severino, como não é o quintal da
casa de Lula nem pode ser de nenhum futuro presidente. O Brasil
é meu, é seu, é nosso, e não tem
cabimento que parentes sejam
empregados e deputadas mandadas para Nova York para o presidente da Câmara ficar cada vez
mais poderoso com seus favorezinhos. É um comportamento primitivo, mas é assim que funcionam os Severinos.
Existem parlamentares que são
conscientes do mal que isso pode
fazer ao país. Não sei quantos eles
são, mas tremo à idéia de que sejam uma minoria -afinal, ele foi
eleito presidente da Câmara com
mais de 300 votos. A cassação de
André Luiz até que deu uma certa
esperança, mas logo em seguida o
pai do secretário de Severino foi
indicado -por seus amigos deputados- para o Conselho Nacional de Justiça, onde Severino
agora já tem um pé.
A democracia brasileira precisa
ser aperfeiçoada ou mais vigiada;
pessoas como Severino são engraçadas, com suas opiniões esdrúxulas, mas só numa mesa de botequim em João Alfredo.
Porque são mais perigosas do
que parecem e não deveriam poder se candidatar a nada.
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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