São Paulo, terça-feira, 08 de maio de 2007

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Quem gemeu, levou mais, diz sobrevivente

Estudante de 22 anos conseguiu fugir dos criminosos e se esconder atrás de um caminhão, de onde viu os assassinatos

Durante velório no Jaraguá, amigos afirmam que praça é ponto de tráfico de drogas, mas dizem que vítimas não tinham envolvimento

PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Escondida atrás da caçamba de um caminhão a cerca de 50m da tragédia, uma jovem que conseguiu correr dos assassinos conta tudo o que viu.
A estudante Gisele -o nome é fictício-, 22, dá o seu testemunho no cemitério do Jaraguá, onde estão sendo veladas três das sete vítimas.
A sobrevivente diz que ela e os amigos estavam jogando cartas e tomando cerveja na praça quando uma ruidosa motocicleta apareceu (ou foram duas? ela não sabe dizer) e jogou o farol sobre eles.
Mesmo sem entender direito o que estava acontecendo (até agora, ela não sabe dizer exatamente o que se passou e conta a história com lacunas), Gisele correu para baixo do caminhão, e só ali percebeu que havia sido acompanhada por outro rapaz, também sobrevivente.
Usando capacete por cima de capuzes pretos estilo ninja, o piloto da moto e seu acompanhante desceram e passaram a atirar em todas as pessoas do grupo. Depois de uma rodada de tiros, eles caminharam entre os corpos, para se certificar de que todos estavam mortos.
Nesse momento, Gisele saiu de trás do caminhão, achando que tudo já havia terminado. Ela diz que não sabe até agora como os assassinos não a perceberam ali tão perto.
Ouviu amigos pedindo socorro e, quando se deu conta de que os motoqueiros caminhavam com o dedo no gatilho, voltou para trás do caminhão.
O jovem que se escondeu com Gisele atrás da caçamba quis sair em socorro dos amigos que gemiam, mas ela ponderou dizendo que ele estava louco.
Quem gemeu levou mais tiros dos assassinos, disse ela, até o silêncio completo.
Os motoqueiros finalmente deixaram a praça.
Ainda sem conseguir dimensionar o ocorrido, Gisele achava que ou os amigos tinham corrido ou ainda iriam se levantar. Com exceção de dois agonizantes, estavam todos mortos.
Gisele conta que Pamela, 18, foi a primeira a ser alvejada. Levou três tiros na cabeça. Carol, 22, ainda falou um pouquinho, antes de morrer. Chegou a mostrar os dedos em sinal de paz e amor, pediu ajuda para levantar-se e disse que não estava tão mal assim.
No velório dos amigos, todos concordam que a praça é, sim, um ponto conhecido de tráfico e uso de drogas na região. Mas a unanimidade afirmou também que nenhum dos jovens mortos estava envolvido com o tráfico -nem era usuário.
Então, o que motivou o crime?... Deixa pra lá, ironiza uma amiga de Gisele. Ela afirma que, se disser o que acha, amanhã são quinze mortos.
Outro rapaz emenda um "véio", e diz que "eles queriam fazer uma limpa na praça".
Eles quem? Silêncio.
A polícia, dizem todos, chegou "em segundos". Eles colocaram o corpo da Pamela no camburão, limparam a praça toda de balas e foram embora.
Na delegacia, perguntaram a ela se as vítimas "tinham treta com o pessoal da Arábia". Arábia é uma região conhecida pelo tráfico. Ela conta que os policiais indagaram se os jovens mortos "eram todos drogados".


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