São Paulo, domingo, 08 de setembro de 2002

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SISTEMA PENITENCIÁRIO

No próximo domingo acontece a última transferência; local irá virar um centro de formação cultural

Em 7 dias, o último "bonde" deixa o Carandiru

ANDRÉ CARAMANTE
DO "AGORA"

Hoje é o último domingo de visita no Carandiru, o maior presídio da América Latina e considerado o melhor exemplo do fracasso do sistema prisional no país.
Pela penitenciária, passaram, além de milhares de anônimos, criminosos famosos, como João Acácio Pereira da Costa, o "Bandido da Luz Vermelha", e o cirurgião plástico Hosmany Ramos -ainda hoje preso.
O próximo domingo, dia 15, é a data estabelecida para o fim da cadeia. Nos momentos que antecedem esse fim, 155 presos aguardam, nas celas do 2º andar do pavilhão 7, o anúncio do último bonde -transferência, na linguagem dos presidiários,- para prisões do interior do Estado.
A última entrada de parentes e amigos de detentos acontecerá sábado, dia 14, quando também deverá ser publicada no "Diário Oficial" do Estado de São Paulo a extinção das três penitenciárias que hoje formam a detenção.
Nessa data, véspera do último bonde, serão apenas 80 os moradores do "país das calças beges" -porque na detenção, considerada um exemplo do fracasso do sistema penitenciário do país, todo preso vestia calça dessa cor.
Segundo o governo, eles e outros 104 presos "temporários", que aguardam transferência no pavilhão 4, deixarão a cadeia, que está perfurada por uma quantidade interminável de túneis, pontualmente às 9h30. A cobertura do evento será histórica, pois, desde 1983, a desativação da Casa de Detenção é meta dos governadores do Estado.
Mas a pressão para pôr abaixo o local ganhou força em 92 logo após o chamado "massacre do Carandiru", quando 111 presos foram mortos durante a invasão da tropa de choque no local.
O processo de desativação do Carandiru, porém, só teve início em dezembro de 2001.
Até mesmo os saguis que vivem nas árvores da Divinéia, principal praça da detenção, tomarão bonde na próxima semana para o Zoológico, dizem os funcionários da cadeia, grande parte deles incrédulos com o fim da prisão.
Ao longo de 46 anos de horror e histórias incríveis -a cadeia foi inaugurada em 1956 pelo então governador de São Paulo Jânio Quadros- a detenção, localizada no nº 2.630 da avenida Cruzeiro do Sul, no Complexo Carcerário do Carandiru (zona norte), recebeu em seus pavilhões cerca de 177 mil homens, entre presos comuns e políticos.
Com capacidade para 3.250 presos, o local chegou a abrigar mais de 7.500. Em julho de 2001, mais um recorde: 106 presos fogem de um único túnel.
O atual governador do Estado, Geraldo Alckmin (PSDB) -candidato à reeleição-, promete demolir três dos sete pavilhões da cadeia no dia 10 de outubro, para transformar a maior prisão da América Latina em um centro de formação cultural.
Apesar das transformações previstas, o alfaiate Manoel Messias Pinheiro, 50, que ficou 22 anos preso no Carandiru, afirma que a imagem do lugar continuará a mesma. "Por mais que tentem, nenhuma flor vai brotar nesse lugar onde funcionou a Casa de Detenção. Aí dentro ó, só se ouvem gritos de almas", disse Pinheiros.



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