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São Paulo, segunda-feira, 08 de setembro de 2003

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ABUSO POLICIAL

Governo do Rio já sabia desde abril sobre violação de direitos na penitenciária onde comerciante chinês foi agredido

Conselho alertou duas vezes sobre torturas

TALITA FIGUEIREDO
FREE-LANCE PARA A FOLHA

O presidente do Conselho da Comunidade (formado por entidades da sociedade civil para fiscalizar o sistema penitenciário), Marcelo Freixo, reafirmou ontem que o secretário de Administração Penitenciária, Astério Pereira, tinha conhecimento desde abril de que havia "prática de tortura" e "violação dos direitos humanos" no presídio Ary Franco, onde o comerciante chinês naturalizado brasileiro Chan Kim Chang esteve preso e teria sido espancado.
Em nota divulgada ontem, o Conselho informou que entregou relatórios ao secretário em duas ocasiões neste ano. O primeiro relatório foi entregue em 1º de abril e protocolado sob o número E-21/10141/03. Tratava das condições em três prisões do Rio, entre elas o Ary Franco. No dia 22 de agosto, três dias antes de Chan ser detido, foram entregues "dois relatórios de inspeções prisionais realizadas nos meses de junho e julho". Segundo a nota, "um desses relatórios tratava da inspeção no presídio Ary Franco".
A nota foi assinada por 11 conselheiros que afirmaram repudiar "a alegação [do secretário] de não recebimento do relatório". Anteontem, entrevistado pelo secretário de Segurança Pública, Anthony Garotinho, no seu programa radiofônico semanal, Pereira negou que tivesse conhecimento do relatório e de suas denúncias.
O conselho divulgou ainda a ata da reunião, na qual está registrada a entrega dos relatórios.
Hoje, duas testemunhas devem depor na Delegacia de Homicídios, que apura o caso. Eles seriam presos que foram transferidos do Ary Franco para outro presídio na sexta-feira e estão sob proteção policial. Garotinho disse ontem estar "convicto que houve tortura" no caso do comerciante.
"Tenho três convicções. A primeira é que o chinês foi agredido também pela Polícia Federal, porque temos uma testemunha que fala isso. A segunda é que não foram as agressões praticadas pela Polícia Federal que levaram à sua morte. E, terceiro, que houve, dentro do presídio, uma situação inadmissível de tortura, de violência", disse Garotinho.
A Superintendência da Polícia Federal do Rio não quis comentar as declarações de Garotinho.
Os seis agentes presos anteontem devem prestar novos esclarecimentos à polícia hoje. A versão deles é que o chinês se machucou depois de um surto, no qual teria se debatido muito e batido a cabeça em um arquivo. "Isso é história da carochinha. É uma história que não tem nenhuma sustentação do ponto de vista policial", disse.
Garotinho defendeu mais uma vez Pereira. "O secretário não compactuou em momento algum com essa situação", disse.
Hoje à tarde, a família do chinês irá à Comissão de Direitos Humanos da Alerj, que também investiga a situação da morte de Chan. Eles vão processar a União.
Chan, 46, foi preso em 25 de agosto no aeroporto Internacional do Rio pela PF ao tentar deixar o país com cerca de US$ 30 mil, sem declará-los à Receita Federal. No dia seguinte, foi levado para o presídio Ary Franco. No dia 27, ele foi encontrado caído no chão, com várias escoriações pelo corpo. Depois de uma semana internado, morreu de traumatismo craniano e pneumonia dupla.


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