São Paulo, sexta-feira, 08 de setembro de 2006

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Adolescentes expõem corpos em fotologs na busca da fama virtual

Garotas de 14 a 17 anos fazem poses sensuais para atrair visitantes para suas páginas

DANIELA TÓFOLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Elas querem chamar a atenção. Para isso, vale mostrar os seios, beijar a amiga na boca, fazer poses sensuais. Adolescentes, na maioria entre 14 e 17 anos, cada vez mais garotas se autofotografam e expõem seus corpos nos próprios fotologs (espécie de álbum virtual).
Sem nenhuma vergonha, tiram fotos com decotes e olhares provocantes, de lingerie entre lençóis ou se agarrando com amigas, que podem ser vistas por quem quiser em qualquer parte do mundo. Bastam alguns cliques na internet.
O vício, como elas mesmas definem, faz parte da vida de boa parte de jovens de classe média. Com uma câmera digital, chegam a postar até 15 fotos por dia em suas páginas virtuais e ficam torcendo para que admiradores vejam as imagens. Quanto mais gente acessar o fotolog, mais famosas se tornam.
A fama no mundo da net é tão sedutora quanto a da vida real. Donos de fotologs famosos chegam a ter fã-clubes e tudo o que fazem, ou dizem, vira moda. "Em uma época na qual as celebridades são valorizadas pelo seus corpos, é difícil convencer uma menina a não se expor", diz o psiquiatra da Unifesp Geraldo Possendoro, professor de terapia cognitivo-comportamental. "A vaidade natural dessa faixa etária é potencializada pelo contexto atual, pelo que é veiculado na TV. A internet facilita a exposição."
Não existem números oficiais de fotologs no Brasil, mas um dos endereços que hospedam as páginas pessoais tinha ontem 2.967.147 álbuns (sendo que 4.117 foram criados ontem mesmo), com 64.684.793 fotos. Geralmente, as páginas exibem uma foto grande e três ou quatro menores nas laterais, além de um link que dá acesso às imagens antigas. O dono do fotolog pode fazer comentários sobre as fotografias e tem um espaço reservado para falar mais sobre sua vida.
Em uma das páginas, onde aparece de lingerie com closes dos seios e na barriga, a garota de 15 anos se descreve como "sexy e única" no seu perfil. Em outra, uma de 16 anos aparece de biquíni com as pernas abertas e fazendo beicinho. Diz que gosta de "tirar uma onda dos homens". Uma terceira página mostra os seios de uma menina de 14 anos. A jovem pede aos internautas que adicionem seu fotolog ajudando-a, assim, a se tornar mais popular.
As fotografias mais picantes nessas páginas não são maioria. Estão lá para atrair visitantes, são as chamadas "fotos de visita". As outras imagens mostram a vida normal das meninas: retratos com a turma, na escola, em shoppings, na praia e até na aula de balé. Não são garotas de programa, são meninas que querem "aparecer".
"A mulher, por natureza, gosta de chamar a atenção. É vaidosa e tem orgulho de exibir o corpo", diz Maria Helena Vilela, presidente do Instituto Kaplan - Centro de Estudos da Sexualidade Humana. "Na adolescência, essa necessidade de se mostrar aumenta, pois a garota quer se sentir popular e aceita pelo grupo. Muitas vezes, só põe esse tipo de foto porque as amigas colocaram. Os pais precisam conversar, e não proibir, para saber o que a filha quer com esse comportamento."
Filósofo formado pela PUC-RS e praticante da filosofia clínica, Lúcio Packter diz que, ao atender jovens, percebe que muitos se exibem sem ter dimensão da exposição. "Hoje não há mais separação nítida entre o privado e o público, e eles ainda não têm ciência de como usar o computador."
Para Suely Gevertz, psicanalista do Instituto Sedes Sapientiae, apesar de parecer, os jovens hoje não amadurecem mais cedo. "Continuam imaturos emocionalmente e sexualmente. Fazem a exposição pela exposição." Criticado há 15 anos por clicar ninfetas em poses ousadas para o livro "Anjos Proibidos", o fotógrafo Fabio Cabral diz que as meninas querem se mostrar por saber que essa é uma forma garantida de sucesso. "A mídia incentiva o culto à autoprojeção e a garota acha que mostrar o corpo é sua salvação para ficar famosa", diz. "Na época do livro, a sociedade hipócrita fez um escândalo. Hoje, não olha para o que ocorre dentro de casa."
Na Delegacia de Crimes Eletrônicos da polícia paulista, dos 1.300 inquéritos, cerca de 60% se referem a crimes contra a honra, praticados em sua grande maioria por pessoas que manipularam fotos de mulheres, veiculadas na internet. Segundo o delegado Plínio Sales, é comum haver denúncias de difamação ou injúria por parte de usuários de fotologs. "Eles se esquecem que as fotos ficam à disposição de qualquer um." Nenhum fotolog concedeu entrevista à Folha.
Na Delegacia de Crimes Eletrônicos do Departamento de Investigação sobre o Crime Organizado da polícia paulista, dos 1.300 inquéritos, cerca de 60% se referem a crimes contra a honra, praticados em sua grande maioria por pessoas que manipularam fotos de mulheres, veiculadas na internet.
Segundo o delegado Plínio Sales, é comum haver denúncias de difamação ou injúria por parte de usuários de fotologs. "Eles se esquecem que as fotos ficam à disposição de qualquer." Promotor da infância e juventude, Motauri Ciochetti de Souza diz que é difícil punir alguém que coloca as próprias fotos na internet. "Mesmo sendo menor e estando em poses sensuais, a punição só irá ocorrer se a foto for muito agressiva." Nesse caso, os pais podem até perder o pátrio poder e, os provedores, serem penalizados por veicular fotos de menores em situações pornográficas. "Mas a linha entre o que é erótico e o que é apenas sensual é muito sutil e depende da interpretação de cada juiz", afirma. "O melhor é os pais ficarem atentos para evitar problemas maiores." Nenhum fotolog respondeu aos pedidos de entrevista feito pela Folha.


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