São Paulo, domingo, 08 de outubro de 2006

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DANUZA LEÃO

As dificuldades


Nunca há um equilíbrio; ou acontecem muitas coisas ao mesmo tempo ou não acontece nada

A VIDA é engraçada. Às vezes está parada, sem acontecer nada em nenhum setor, seja no pessoal, seja no afetivo, seja no profissional. Mas de repente começam a surgir coisas (sempre ao mesmo tempo), e quem estava vivendo um período de quase felicidade -uma felicidade morna, é verdade-, começa a se angustiar sem saber o que deve fazer. Continua tranqüila, calma, numa vida de deliciosa rotina, ou entra na roda viva? Bem que às vezes sentia falta de uma coisa mais trepidante, e sabe que, se topar, o coração vai começar a bater mais forte, a cabeça a estalar, dormir nem pensar e ficar sem tempo pra nada, mas nessa hora acha que isso é viver intensamente, e no começo vai até gostar. Mas às vezes vai lembrar com saudades dos tempos mais calmos e voltar a ter suas dúvidas, igualzinho a antes, e vai se perguntar: será que fiz bem?
Nunca há um equilíbrio; ou acontecem muitas coisas ao mesmo tempo ou não acontece rigorosamente nada, e é você quem tem que escolher se aceita o que a vida oferece (às vezes) ou diz não; mas pode ser que a ocasião passe e você volte a viver naquela bendita -bendita?- calmaria, com tempo para pensar na vida, ficar angustiada, neurótica, deprimida e tomando remédio para dormir. O que fazer, então? Se aconselhar com os amigos, é claro.
O pior é que conselho não adianta. Dependendo de como é aquele com quem você se aconselhar, ele vai dizer para ir em uma direção ou na oposta, e, no final das contas, quem vai ter que decidir é você mesma. Está aí o exemplo de Lula, que não me deixa mentir. Quantos terão dito a ele para ir ao debate? Quantos terão dito para não ir? Cada um tem que tomar suas próprias decisões, usando bom senso e equilíbrio; muito fácil de falar, mas seja qual for o assunto, seja qual for sua experiência de vida, ter bom senso e equilíbrio é muito difícil. Tudo é difícil, mas difícil mesmo é dispensar a empregada.
Um belo dia você acorda querendo mudar tudo. Pensa que se é complicado morar com um marido, absurdo maior é coabitar com uma pessoa estranha que só faz uma coisa na vida: cuidar de você. Afinal, não precisa de mais do que uma faxineira duas vezes por semana. Ela cozinha do jeito que você gosta (mas 27 dias por mês você faz dieta), fala pouco e não incomoda, os amigos adoram seu tempero e vivem pedindo para jantar na sua casa. Então pra quê mudar? E se não se der bem com uma diarista? E se ficar gripada com febre, quem vai levar um chazinho na cama? E se levar um tombo no banheiro e quebrar a perna? E a culpa só de pensar que ela talvez tenha dificuldade em encontrar outro emprego? Muito mais fácil escolher em quem vai votar no segundo turno.
Tenho um amigo inteligente, bem-sucedido, cheio de personalidade, que um dia resolveu mudar tudo, mas quando viu que não ia conseguir combinou com uma amiga: saiu de casa às oito da manhã, ela chegou às nove, disse à empregada mais ou menos tudo que ele não tinha coragem de dizer, acertou regiamente as contas, ela saiu levando as suas coisas (muito importante), devolveu as chaves e ele só voltou com o assunto totalmente resolvido.
Covardia? Não. Apenas uma das dificuldades do ser humano - e essa, por incrível que pareça, é das maiores.
PS - Lula elogiando Collor e Garotinho apoiando Alckmin. Que situação.

danuza.leao@uol.com.br


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