São Paulo, domingo, 08 de outubro de 2006

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VÔO 1907 / INVESTIGAÇÃO

FAB apura se Legacy precisava de recall

Investigação apontará se equipamento apresentou a mesma falha apontada pelas autoridades norte-americanas

Para o brigadeiro José Carlos Pereira, da Infraero, "isso pode explicar o acidente, e acrescenta mais fatores de responsabilidade"

IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A FAB (Força Aérea Brasileira) vai apurar se o transponder do jato Embraer Legacy que colidiu com o Boeing da Gol há dez dias matando 154 pessoas apresentou a falha apontada pelas autoridades americanas -que determinou um recall do equipamento marcado para começar no dia 17 de outubro.
A Folha revelou ontem que a FAA (Administração Federal de Aviação) indicou, em 12 de setembro, que o transponder podia ficar inoperante inadvertidamente se a tripulação manuseasse um botão no painel de comunicação do avião por mais de cinco segundos.
Sem o transponder, equipamento que transmite dados como altitude e velocidade do avião para o controle em solo e outros aviões, o sistema anticolisão do avião não consegue "avisar" o mesmo aparelho em outra aeronave.
Embora isso seja apenas mais um fator contribuinte para o acidente -já que o Legacy estava em altitude incorreta e houve aparente falha de comunicação entre pilotos e o controle de Brasília-, se o sistema anticolisão estivesse operante é possível supor que o choque não teria ocorrido. Isso se não houve falha no Boeing, o que apenas a caixa-preta dirá.
"É um fator importante a apurar", disse o brigadeiro Teles Ribeiro, chefe da comunicação da FAB. Para o brigadeiro José Carlos Pereira, da Infraero (estatal que gerencia os aeroportos), "isso pode explicar o acidente, e acrescenta mais fatores de responsabilidade".
Segundo a assessoria de imprensa da Embraer, a política da empresa é esperar o final das investigações para se pronunciar sobre o incidente.
A diretriz da FAA é de 12 de setembro e atinge 1.365 aviões, de vários fabricantes, como Cessna e Bombardier. No caso da Embraer, os modelos afetados são os da linha EMB-135 (da qual o Legacy faz parte) e o da EMB-145. A Diretriz de Aeronavegabilidade 2006-19-04 diz: "Essa diretriz resulta do fato de o transponder incorretamente entrar no modo stand-by se a tripulação levar mais de cinco segundos usando o botão giratório da unidade de rádio para mudar seu código de controle aéreo. Estamos emitindo essa diretriz para evitar que o transporte dessa unidade de comunicação entre em modo stand-by, o que pode aumentar o trabalho da tripulação e resultar no funcionamento impróprio do Sistema de Alerta de Tráfego Anticolisão".
Ou seja: se o piloto mexeu no botão em que ele determina o código de 4 números que identifica a aeronave nos radares, um defeito pode ter colocado o transponder num modo inativo (o stand-by, ou espera) -e, logo, desabilitando seu sistema anticolisão. Isso explicaria por que os pilotos dizem que não desligaram nada intencionalmente e por que o avião sumiu do radar secundário, que detecta detalhes via transponder, das telas de Brasília -permanecendo como um ponto impreciso no console.
Não há alerta sobre essa mudança, embora em tese ela deveria ter ficado registrada no indicador do painel. A análise da caixa-preta do Legacy não deverá ajudar nesse ponto: o transponder não estava conectado a ela, e não há nenhum regulamento que preveja isso.
"O que é estranho é que o piloto só deveria mexer nesse seletor com orientação do controle de vôo", diz o brigadeiro Pereira. "Pode ter ocorrido algo, ele inadvertidamente tocou no botão por mais de cinco segundos, mas isso é hipótese."
De fato, esse código de controle só é alterado se houver orientação do controle em solo, e tanto os pilotos quanto o Comando da Aeronáutica dizem que não conseguiram comunicar-se um com o outro.
A diretiva norte-americana vale para todos os países em que os aviões voam porque o transponder é de fabricante dos EUA, a Honeywell.
Ela determinava que em 14 dias a partir do dia 17 fosse alterado o manual de vôo para que o piloto testasse rotineiramente o transponder durante o vôo. Além disso, dava prazo de até 18 meses para a troca, dependendo do modelo, de partes ou da totalidade do transponder.
Apesar de a hipótese de o transponder ter apresentado defeito responder a um dos mistérios do acidente, ele não explica tudo. Há dúvidas importantes. Por exemplo:
1 - por que o Legacy estava a 37 mil pés, na "contramão" da aerovia pela qual vinha o Boeing, em desacordo com o seu plano de vôo?;
2 - FAB e pilotos argumentam que tentaram falar, por quase uma hora, um com os outros. De quem foi a falha? Isso só a investigação responderá.


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