São Paulo, segunda-feira, 08 de outubro de 2007

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No Rio, 45% das pessoas ouvem tiros sempre

Segundo pesquisa da Uerj, apenas 18% dos habitantes da cidade dizem nunca ter ouvido os sons de disparo de armas

A Barra da Tijuca é o único lugar da capital fluminense em que a maioria dos moradores afirma nunca ter escutado o barulho de balas

ITALO NOGUEIRA
DA SUCURSAL DO RIO

Ouvir o barulho de pistolas e metralhadoras já se tornou freqüente para 45% dos cariocas, afirma pesquisa do Nupevi (Núcleo de Pesquisa das Violências) da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro).
Segundo a pesquisa, apenas 18% dos moradores da cidade afirmam nunca terem ouvido tiros. Estes estão concentrados na Barra da Tijuca, única área pesquisada em que a maioria (90,2%) dos entrevistados disse nunca ter sido afetado pela "trilha sonora".
"O principal efeito disso é a sensação de insegurança. Quanto mais se ouve tiro, mais se quer mudar. Mas, aos poucos, as opções dentro da cidade vão acabando", disse Alba Zaluar, coordenadora da pesquisa. Os pesquisadores entrevistaram cerca de 3.600 pessoas no ano passado.
Os moradores de favelas do Rio de Janeiro, habituais palcos de operações policiais, são evidentemente os que mais ouvem os sons dos confrontos: 45,4% dizem sempre ser incomodados pelos disparos e 8,8% afirmam ouvir os barulhos com freqüência.
Na área do Complexo do Alemão, onde a Polícia Militar faz operações sistemáticas desde 1º de maio, 50,4% dos moradores afirmam que sempre ouvem os ruídos. Outros 13,9% dizem escutar freqüentemente e 20,2%, às vezes. Apenas 6,3% disseram nunca ter escutado um disparo. Nas regiões faveladas desta área, 57,5% dos entrevistados sempre notam tiros.
Na área da Tijuca, 68% escutam rajadas de fuzis e pistolas ao menos freqüentemente.
"Considerando que cada caso é singular, (...) podemos hipotetizar que quem está sob essa guerra constante -tiros, assaltos-, seja na zona sul carioca ou nas favelas, tende a desenvolver comportamentos graves como paranóia, fobia, comportamento dito anti-social, entre outros", afirma o professor do Instituto de Psicologia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Rogério Lustosa.
"Em geral, os efeitos da violência precisam ser analisados através dos lados individual e familiar da pessoa e da rede de relações em que ela vive, do lado das instituições dela", diz.
Zaluar afirma que a pesquisa será complementada com outros dados. Será estudado, por exemplo, se nas áreas em que se ouve muito tiro há mais casos de doenças cardiovasculares.
O convívio com os sons de tiros é diverso. "Para o carioca, já é meio que divertido, para quem não está na linha de tiro. É uma coisa corriqueira", afirmou o estudante de turismo Thiago de Albuquerque Bierrenbach. Ele morava em São Conrado, próximo à favela da Rocinha, e ouvia "freqüentemente" tiros do local.
Atualmente, mora em Copacabana, próximo à favela Pavão-Pavãozinho, onde "ainda" não ouviu confrontos.
Para o DJ Marlboro, o som de tiros que aparece em algumas de suas mixagens "é a realidade sonora do Rio". "Não quer dizer que quem faz isso [as músicas] está apoiando [os tiros], mas só relatando o que acontece."
Ele deixou o bairro do Engenho de Dentro -onde 50,7% dizem sempre ouvir tiros- após três tentativas de assaltos a mão armada para morar na Barra, bairro mais "silencioso" do Rio de Janeiro.

Seqüestro
Um adolescente de 15 anos foi seqüestrado, torturado e, segundo a polícia, escapou por pouco de ser morto ao sair de um baile funk ontem em uma favela da zona norte do Rio.
O seqüestro aconteceu por volta das 6h, na Baixa do Sapateiro, uma das 28 favelas que formam o complexo da Maré e que é dominada pela facção criminosa TCP (Terceiro Comando Puro). O adolescente contou à polícia que foi apanhado porque errou o caminho ao voltar de um baile na vizinha Nova Holanda, dominada pela facção rival CV (Comando Vermelho). Ele foi libertado pela polícia.


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