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WALTER CENEVIVA
Visão moral e tributo
Há vários lados tristes da imoralidade fiscal. Um exemplo é o desequilíbrio da carga tributária no país
MUITO EMBORA A CPMF
ameace o cenário fiscal na
volta efetiva dos congressistas ao trabalho, talvez seja destinado ao IOF o papel principal de astro das manchetes sobre economia e
finanças em 2008. Trata-se de típico
imposto à disposição do Executivo
para interferir nas operações de crédito, câmbio e seguros ou relativas a
títulos ou valores mobiliários, referidas pela Constituição no artigo
153, inciso V, com função reguladora. Para esse fim, o IOF pode ser alterado, desde que respeitados os requisitos da Carta Magna e a natureza extrafiscal do tributo.
O governo quis aumentar a tributação após a derrota da CPMF. Editou o decreto nº 6.306/07. Foi insuficiente. Quis preencher o vácuo
com os decretos nº 6.339 e 6.345,
ambos de 2008. Não foi avanço juridicamente qualificado porque teve
de mostrar a verdadeira intenção de
aumentar as alíquotas do tributo.
Trata-se de orientação de duvidosa constitucionalidade, a depender
de pronunciamento do STF (Supremo Tribunal Federal). Mesmo com
a decisão da ministra Ellen Gracie
de fazer julgar as questões liminares
junto com o mérito, é possível que
esse pronunciamento demore.
Farei uma súmula de princípios
fundamentais da tributação, colhida
em meu livro "Direito Constitucional Brasileiro" (Saraiva, 3ª edição),
para questionar a constitucionalidade do caminho governamental. A
edição do livro é anterior à situação
agora criada, afastando a eventual
conotação política.
O princípio da legalidade dispõe
que ninguém é obrigado a pagar tributos, senão em virtude de lei. A lei
quer também que os governos observem regras da capacidade contributiva, do caráter não-confiscatório
e da moralidade, ao propor tributos
ou quando queiram aumentá-los. O
administrador público que aumente
indevidamente os impostos ofende
especialmente o princípio da moralidade, previsto no artigo 37 da
Constituição.
Dois outros princípios são referíveis: o da anterioridade (o tributo só
incide a contar de sua criação ou de
sua transformação, determinada em
lei) e o da anualidade, que veda instituir ou aumentar tributo no mesmo
exercício financeiro em que vigorar.
No caso aqui examinado o governo invoca o parágrafo 1º do artigo
150, pelo qual a proibição do inciso
III, "b" não se aplica (entre outros
tributos). Ou seja, o governo quer
cobrar o imposto no "mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou". A lei não é do mesmo exercício financeiro e a lei não aumentou
a incidência do IOF.
Posta de lado a questão do IOF, há
vários lados tristes da imoralidade
fiscal. Exemplo: o desequilíbrio da
carga tributária. A imposta à classe
média é relativamente mais onerosa
da cobrada dos mais ricos. Os encargos excessivos ajudam a explicar (ou
disfarçar) rombos da corrupção, de
erros administrativos e até dos cartões de crédito corporativos.
Agora se diz que o Congresso Nacional ao voltar ao trabalho vai discutir a idéia de isentar as indústrias
bélicas (dos fabricantes de armas)
da tributação que sobre elas incide.
O leitor, preocupado com os princípios constitucionais, pode perguntar por que não aplicar essa isenção
para os fabricantes de alimentos?
Fabricantes de roupas? De remédios? Seria, ao menos, igualdade
compreensível para o povo.
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