São Paulo, segunda-feira, 09 de abril de 2007

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Nova técnica cirúrgica usa orifícios naturais

Vantagens são a redução de custos, da recuperação e de riscos de infecção

Procedimento pode ser utilizado em operações de vesícula, apêndice e útero; em alguns casos, a alta pode ocorrer no mesmo dia

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

Ivonne Tuch retirou o útero e, três dias depois, passeava pelas ruas dos Jardins (zona oeste de SP), com seu o cão maltês. Neusa Maia operou a vesícula e, após 48 horas, estava às voltas com os afazeres de casa, em Teresópolis, região serrana do Rio. Em comum, elas têm o fato de terem feito cirurgias sem cortes aparentes e, dizem, sem dor no pós-operatório.
As operações por meio de orifícios naturais do corpo -no caso das mulheres acima, a vagina- são uma nova realidade no país, embora ainda feitas em poucos hospitais. Podem ser feitas pela vagina, boca, uretra e ânus -nos dois últimos casos, ainda em fase experimental.
As vantagens, segundo os médicos, são custos mais reduzidos, recuperação mais rápida e menos riscos de infecções.
Para operar o apêndice ou a vesícula biliar, por exemplo, os médicos introduzem o bisturi por dentro do tubo digestivo. Um corte na parede do estômago, e se atinge a vesícula.
O procedimento não deixa cicatriz aparente e a recuperação é mais rápida, porque menos camadas de tecidos têm de ser cortadas para se atingir o ponto que necessita ser operado.
A vesícula também pode ser retirada pela vagina, por via endoscópica. No mês passado, o país assistiu pela primeira vez a uma cirurgia dessa natureza. Foi feita pela equipe do cirurgião Ricardo Zorrón, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Neusa Maia, a paciente, não chegou nem a tomar analgésico após a operação. "Nem acredito que operei", disse ela, uma semana depois da cirurgia.
Chamada de Notes (Natural Orifice Translumenal Endoscopic Surgery), esse tipo de cirurgia ainda está na fase experimental em vários países do mundo. A equipe da UFRJ testou a técnica durante um ano e meio em animais antes de passar a adotá-la em humanos.
Segundo Zorrón, a cirurgia consiste em introduzir um endoscópio flexível (aparelho que faz uma inspeção visual do órgãos e o opera) e instrumentos especiais por meio de um corte de um centímetro no interior da vagina. O aparelho é capaz de fazer curvas e percorrer todo abdome até chegar à vesícula. A operação é feita com anestesia geral e dura 50 minutos.
"É uma nova revolução da cirurgia. Primeiro foi a anestesia, depois a videolaparoscopia, agora, a cirurgia por orifícios naturais. Por não ter incisão no abdome, a paciente fica sem dor já no pós-operatório."
Zorrón explica que, 48 horas após a cirurgia, a paciente já pode trabalhar ou realizar outras atividades.
A mesma técnica, segundo o médico, pode ser usada em biopsias para diagnósticos de câncer e retirada de tumores benignos, que hoje demandam pequenas cirurgias.

Ginecologia
Segundo o ginecologista e obstetra Thomaz Gollop, professor da USP (Universidade de São Paulo), histerectomias (cirurgias de retirada do útero, em casos de miomas de grandes proporções e de hemorragias abundantes) e laqueadura de trompas -quando indicadas e dentro dos limites legais- também são muito facilitadas se, em vez de serem feitas pelo abdome, utilizarem como via de acesso a vagina.
A diferença nesses casos em relação à técnica Notes é não ser necessário o uso do endoscópio no procedimento, o que barateia o procedimento.
"Um corte no fundo da vagina é o suficiente para se alcançar o útero ou a trompa", afirma Gollop.
As cirurgias têm sido feitas nos hospitais Albert Einstein e Pérola Byington, ambos em São Paulo. Em alguns casos, explica o médico, a paciente opera de manhã e tem alta à tarde ou, no mais tardar, no dia seguinte. Em quatro a cinco dias, já pode retomar as atividades normais.
"Pelo abdome, leva-se de quatro a cinco dias de internação e duas a três semanas para voltar às atividades", explica o médico, que utiliza nesses casos a raquianestesia (anestesia por injeção do anestésico no canal vertebral).
Segundo ele, além da redução nos custos (chega a 50%), há menos chances de complicações e da necessidade de reinternação da paciente.
"[A técnica] Tem um apelo muito grande tanto para as mulheres como para as instituições hospitalares, porque fica muito barata. A cirurgia só precisa de uma caixa de instrumentos que custa R$ 5.000."


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