São Paulo, segunda-feira, 09 de julho de 2001

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SISTEMA PRISIONAL

Detentos saíram por um túnel que, segundo a direção da Casa de Dentenção, foi escavado de fora para dentro

105 escapam na maior fuga do Carandiru

ALESSANDRO SILVA
DA REPORTAGEM LOCAL

A Casa de Detenção de São Paulo, o presídio mais populoso da América Latina, teve ontem a maior fuga de presos de sua história: 105 deles escaparam por meio de um túnel. Até o fechamento desta edição, apenas um havia sido recapturado pela polícia.
A hipótese mais provável é que tenha ocorrido o primeiro ""resgate subterrâneo" da história prisional de São Paulo, porque o buraco de 13 metros de comprimento teria sido escavado de fora para dentro das muralhas.
O túnel foi descoberto por volta das 12h30, mas a fuga pode ter ocorrido antes disso. Somente à noite, passadas oito horas, a direção do presídio confirmou o número de fugitivos. É que a contagem nos pavilhões começou depois da visita dos parentes, às 17h, por causa do risco de rebelião.
Fugiram detentos de quatro dos seis pavilhões da Casa de Detenção, hoje ocupados por 7.200 presidiários. Os dois únicos onde não houve fuga reúnem presos do ""seguro", os ameaçados de morte, e os estrangeiros -todos que não se misturam com os demais.
A maioria dos foragidos (78) saiu do pavilhão 8, onde estão os chamados reincidentes -criminosos que passaram mais de uma vez pelo complexo do Carandiru.
Assaltantes e homicidas fazem parte da lista dos foragidos, cujos nomes seriam entregues de madrugada para a polícia.
Criada em 1956 pelo então governador Jânio Quadros, a Casa de Detenção tinha como recorde os 51 presos que escaparam de uma vez em maio de 96.
Ontem à noite, a Secretaria da Administração Penitenciária determinou a abertura de sindicância interna para verificar se funcionários colaboraram para fuga. A polícia também investigará o caso em inquérito.
""Do jeito como o plano foi feito, de fora para dentro, não seria preciso ajuda interna", afirmou ontem o diretor da penitenciária 1 (pavilhões 2, 5 e 8) da Casa de Detenção, Jesus Ross Martins.

Engenharia
O buraco por onde os presos saíram tinha 80 centímetros de diâmetro, um metro de profundidade e ficava a 12 metros, aproximadamente, do meio da avenida general Ataliba Leonel, onde passa um córrego subterrâneo.
Da galeria, os foragidos podem ter caminhado em diversos sentidos -por isso, não teriam sido notados. Pelo menos dois veículos foram observados pela Polícia Militar, logo que o buraco foi encontrado, dando cobertura do lado de fora dos muros.
A direção do presídio deduz que a passagem foi aberta da galeria para o presídio por causa da localização do buraco: encostado à muralha e em local aberto -um campo de futebol. Não daria para escavar e retirar a terra, diariamente, sem ser notado pelos PMs.
É possível que os presos não tenham saído de uma vez, mas aos poucos, porque o acesso ao campo estava restrito ontem a apenas três pavilhões: 2, 5 e 8.
O túnel só foi percebido porque policiais militares das muralhas estranharam o número de presos perto de uma tenda improvisada com cobertores, à encosta do muro. Um tiro chegou a ser disparado contra o chão, perto do grupo, para que eles se dispersassem.
""O sentinela viu ainda três presos entrando no buraco", disse o capitão George Henrique Marques Alves, 36, supervisor da PM na zona norte da capital.
A polícia cercou o complexo do Carandiru, vistoriou galerias e usou até um helicóptero para tentar encontrar os fugitivos.
Nas tubulações da rua, os PMs encontraram uma calça bege, das que os presos usam, fio elétrico, cordas, uma pá e sacolas -que provavelmente serviram para transportar roupas limpas e secas.
Houve disparos dentro das tubulações, porque os policiais chegaram a ver vultos dentro delas. Peças de roupas saíram boiando das galerias, mas não se sabe se pertencem a presos ou não.
Pelo menos três tampas de inspeção, daquelas que ficam no meio das ruas, estavam travadas por dentro, com cordas e madeira, para dificultar a abertura.
As galerias ao redor da Casa de Detenção passaram por inspeção em fevereiro deste ano, após a fuga, em dezembro do ano passado, de 35 detentos. Essa foi a segunda maior da história do presídio.

Mistério
Segundo diretores da Casa de Detenção, a fuga deve ter ocorrido ontem mesmo, porque não foi notada a falta de presos na contagem feita anteontem à noite.
Eles não conseguiram, contudo, explicar como presos de diferentes pavilhões conseguiram sair juntos. Desde março, o presídio vem sendo dividido em três unidades menores, autônomas e isoladas, criadas para tentar reduzir o poder das facções, como o PCC (Primeiro Comando da Capital), o grupo que organizou a maior rebelião da história do país, em fevereiro passado.


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