São Paulo, quarta-feira, 10 de abril de 2002

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Violência pára aulas e afugenta moradores

SABRINA PETRY
DA SUCURSAL DO RIO

Mais um confronto entre traficantes na madrugada de ontem voltou a assustar os moradores dos morros do Encontro e da Matinha, em Engenho Novo, bairro da zona norte do Rio. Anteontem, duas pessoas, entre elas uma mulher grávida, morreram durante um tiroteio nas favelas.
Não houve vítimas desta vez, mas os moradores estão apavorados com a violência imposta pelo tráfico de drogas. Na escola municipal que funciona em uma das entradas da favela, poucos alunos apareceram para assistir às aulas. Muitas mães foram até lá comunicar que os filhos passariam a frequentar outra instituição.
Na turma de André, 6, na qual há 32 alunos, apenas mais dois meninos e uma menina estavam presentes ontem. Ele estuda na mesma sala da filha de Vanessa Ananias de Oliveira, 22, morta durante o conflito de anteontem.
"Meus colegas estão com medo porque a mãe de uma amiga nossa morreu. Todo mundo está com medo de que aconteça alguma coisa de ruim com a gente", disse André, chorando.
Uma professora do pré-primário, que não quis se identificar, contou que, da sua turma de 37 alunos, só dois compareceram. "Isso está uma guerrilha. As mães estão com medo e não deixam os filhos virem. Muitas têm ligado para cá, avisando que vão matriculá-los em outro lugar."
Pelo menos oito escolas da região ficaram fechadas ontem.
A poucos metros do colégio, um prédio que tem a fachada crivada por pelo menos 19 balas está abandonado. O número 85 da rua Açaré está localizado em uma esquina, de frente para os morros do Encontro, da Matinha e dos Macacos, e é atingido por tiros toda vez que os traficantes das três favelas entram em guerra.
Foi no pátio do edifício que o pedreiro David Machado dos Reis, 19, morreu após ser baleado, na madrugada de segunda-feira, no momento em que tentava escapar do tiroteio
No edifício de três andares só moram o zelador com a mulher e o filho. O último morador deixou o prédio há cerca de oito meses. Vizinhos disseram que o dono do imóvel está tentando vender o edifício há dois anos, mas não encontra interessados. Ninguém aparece para alugar os apartamentos vagos, e o próprio zelador está procurando outro emprego para poder ir embora.
O cozinheiro Antônio Santos, 38, também está tentando vender a casa onde mora com a mulher e o filho de 1 ano e 8 meses. "Faz mais de seis meses que nós dormimos no corredor, porque é o único local seguro da casa. Isso não é vida. Quando comprei essa casa, não sabia que a violência era tanta", diz ele, apontando para as 14 marcas de tiro nas paredes.
Na rua ao lado, Leandro Galvão, 23, mostra seu carro que foi destruído pelo último tiroteio. Podem-se contar 39 marcas de balas. Ele disse que, no auge do confronto de segunda-feira, ligou para a polícia pedindo por socorro. "Eles me responderam que era para eu ajoelhar e rezar."



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