São Paulo, sexta, 10 de abril de 1998

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TRÁFICO
Levantamento do Denarc revela perfil de traficantes e dependentes; destes, 75 em cada 100 não têm emprego
Desemprego engrossa tráfico de drogas

GILBERTO DIMENSTEIN
do Conselho Editorial

A elevação do desemprego está produzindo o aumento do tráfico de drogas em São Paulo. Documento produzido pelo Departamento de Investigações sobre Narcóticos (Denarc) revela que, de cada 100 dependentes, 75 estão desempregados, arriscados a entrar no círculo vicioso da marginada e a engrossar o contingente de mão-de-obra dos traficantes. A relação entre drogas e desemprego, já fartamente documentada nos EUA e Europa, começa a ser medida no Brasil, num levantamento do perfil de traficantes e dependentes baseado em 981 entrevistas feitas pelo Denarc. Reservadamente, delegados admitem que o tráfico está fora de controle devido à falta de recursos para o combate e à dimensão da crise social. "Num ambiente de falta de perspectivas, o tráfico de drogas está virando, cada vez mais, uma alternativa de emprego. É uma bomba social", afirma o chefe do Denarc, Jorge Miguel. O tráfico não pára de crescer. Em 1991, foram dados 485 flagrantes; ano passado, 1.346. Naquele ano foram apreendidos 550 quilos de cocaína; em 1997, 780 quilos. Delegados e estudiosos de criminalidade enumeram as mais variadas razões para o aumento do tráfico, mas são unânimes em apontar a desocupação como um dos principais fatores. Responsável pelo combate de drogas nas escolas, a delegada Elizabeth Sato tem constatado a repetição de um história: o indivíduo não consegue colocação, está fora da escola ou tem baixa escolaridade. Por conseqüência, ele se vê tentado ao tráfico. "Eles se explicam dizendo que não conseguem emprego ou não sobrevivem com o subemprego", afirma a delegada Elizabeth Sato. De acordo com as estatísticas, a imensa maioria dos dependentes tem entre 15 e 30 anos- justamente a faixa que o desemprego atinge com maior dureza. Dados do Dieese-Seade informam que, nessa faixa, a desocupação em São Paulo atinge os 30%. Essa percentagem sobe nas camadas mais pobres, sem qualificação e com baixa escolaridade.


Relação com desemprego

Um estudo do Ilanud, feito pelo sociólogo Túlio Kahn, demonstrou que o aumento do desemprego provoca aumento da delinquência, notadamente o furto. O Ilanud é um órgão da ONU que trata da prevenção à violência.
Kahn acompanhou as curvas de desemprego desde 1980. Constatou que, à menor oferta de trabalho, correspondia a elevação dos furtos. Sua pesquisa revela que, no auge do Plano Cruzado, com a redução do desemprego, os furtos caíram 14% na Grande São Paulo. Já em 1992, em plena recessão, subiram cerca de 7%.
"O tráfico passa a ser ainda mais atraente diante da falta de opções para os jovens", afirma Kahn, lembrando que o desemprego é apenas mais um dos fatores sociais por trás das drogas.

Perfil

De acordo com o perfil colhido pelo Denarc, além de desempregado e da idade entre 15 e 30 anos, o dependente é solteiro e, em sua maioria, completou apenas o primeiro grau.
As drogas preferidas são, pela ordem, o crack e a cocaína.
"Um traficante, mesmo iniciante, consegue tirar R$ 900 por mês. Quantos empregos seriam capazes de oferecer essa remuneração?", pergunta Jorge Miguel.
O resultado é que o perfil do traficante revela que vai crescendo a porcentagem dos desempregados ou subempregados presos como traficantes.
Do total de presos por tráfico no ano passado, 76% apresentam escolaridade baixa -até primeiro grau-, que os desabilitam a progredir no mercado de trabalho; cerca de 60% são analfabetos ou não tem sequer o primeiro grau.



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