São Paulo, sábado, 10 de julho de 2004

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SEGURANÇA

O déficit no sistema penitenciário chega a 128.815 vagas e é maior do que a lotação do estádio do Maracanã

Número de presos dobra em 8 anos no país

TIAGO ORNAGHI
DA AGÊNCIA FOLHA

A população carcerária do Brasil dobrou entre os anos de 1995 e 2003. No meio da década de 90, havia 148.760 detentos; hoje, existem 308.304. O déficit de vagas teve um aumento de 60,7% -de 80.163 vagas para 128.815.
O déficit de vagas hoje é maior que a lotação do estádio do Maracanã (122 mil pessoas) e é quase igual ao total da população carcerária de 1995 (148.760).
Os dados constam de estudo que o governo federal encomendou sobre as condições dos presídios e da população carcerária. O relatório ao qual a Agência Folha teve acesso foi feito pela ex-diretora do Sistema Penitenciário e ouvidora de Polícia no Estado do Rio de Janeiro, Julita Lemgruber.
O Brasil tem a segunda maior população carcerária da América, com 187,7 presos para cada 100.000 habitantes (os EUA têm 740 para cada 100.000 habitantes).
O déficit mais do que dobrou de 2002 para 2003. De um ano para o outro, a população carcerária aumentou em 68.197 ingressos, e o sistema perdeu 2.376 vagas.
A população carcerária contabilizada é a que já foi condenada a qualquer pena privativa de liberdade e está presa. Ela deveria estar reclusa em estabelecimentos penitenciários, só que parte dela se encontra em locais inadequados para o cumprimento da pena, como as cadeias de delegacias. Os números estão atualizados até novembro de 2003 e foram obtidos com os governos estaduais.
Para Lemgruber, a falta de vagas é a principal causa para a superlotação que caracteriza os presídios brasileiros. A lotação impede que haja socialização e atendimento correto da população carcerária, o que acaba criando tensão e violência. As constantes rebeliões nos presídios são o resultado final dessa falta de infra-estrutura para manter os condenados. "Temos verdadeiros retratos do inferno nos presídios. Uma maior racionalidade na imputação de penas, o uso de penas alternativas e um empenho do Estado na melhoria dos presídios existentes e na construção de novos é fundamental para resolver o problema."
"A informatização dos dados sobre os apenados e sobre as suas penas permitiria que mais condenados tivessem acesso a benefícios, como cumprir as penas em regime semi-aberto", disse Marcelo Freixo, da ONG Justiça Global, que participou do estudo.
O Ministério da Justiça afirma que esforços estão sendo feitos segundo as determinações do Plano Nacional de Segurança. O diretor do Departamento Penitenciário, do ministério, Cleiton Nunes, diz que precisa haver um comprometimento maior de toda a sociedade e dos Estados. "Há um afastamento dos profissionais que deveriam estar na área penitenciária. Não existe sintonia entre os órgãos nos Estados, secretarias da Segurança, pastorais, patronatos para melhorar as condições e viabilizar a saída dos presos", disse.
"A população carcerária passa a aumentar muito quando se tem um enfrentamento maior ao crime nos Estados. O diagnóstico feito pelo departamento é de que entram no sistema quase 9.000 presos e saem cerca de 5.400."
Um dos principais problemas acarretados pela falta de vagas é a utilização das delegacias para a manutenção de presos já condenados para os quais não há vagas no sistema penitenciário. As delegacias, legalmente, só poderiam manter detentos durante prisões provisórias. Na prática, depois de condenados pela Justiça, os presos permanecem em delegacias ou casas de custódia, como a de Benfica, no Rio de Janeiro, onde houve uma rebelião, em maio, que terminou com 30 mortos.
Minas é o Estado com a pior relação de presos condenados sendo mantidos em delegacias. No Estado, 77,8% dos condenados estão em delegacias e apenas 22,2% estão devidamente no sistema penitenciário. O subsecretário da Administração Penitenciária de Minas, Agílio Monteiro Filho, disse que o Estado quer acabar com o déficit até 2006.


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