São Paulo, sábado, 11 de janeiro de 2003

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LETRAS JURÍDICAS

A Justiça em boas mãos

WALTER CENEVIVA
COLUNISTA DA FOLHA

Chegado o novo governo, a enorme quantidade de avaliações políticas mostra, independentemente de sua qualidade, o impacto da substituição dos eleitos tradicionais por alguns representantes do Partido dos Trabalhadores, com sua origem operária. O ministério faz mixagem de várias correntes. A escolha de Marcio Thomaz Bastos, da elite da advocacia, propõe um esclarecimento de quem é, além de jornalista, advogado e conhece o novo ministro há dezenas de anos: a opinião sobre a excelente nomeação do titular da Justiça é a melhor possível, e o palpite não decorre de nossos laços de amizade.
O advogado militante se liga ao cliente por estreita relação com seus contratos, obrigações em geral, ligações de família, do comércio e da indústria. Tem, por outro lado, intimidade com o confronto entre sociedade e poder, entre famintos governos tributantes e queixosos contribuintes tributados, entre amedrontados devedores do poder público e raivosos credores caloteados pelo mesmo poder. Há o rol dos criminalistas, no qual o ministro se inclui, a cumprirem dever essencial da defesa dos acusados, imposto pelas liberdades democráticas, pela presunção de inocência.
O raio de ação do ministro da Justiça é muito amplo. Compreende atuação administrativa para preservação das garantias da advocacia pelos agentes da União. Inclui cuidados com o Ministério Público Federal, bem como a ação de órgãos federais relacionados com a proteção ambiental, o patrimônio histórico. Atua na interface imprescindível com o Poder Judiciário, em nome do Executivo.
Marcio Thomaz Bastos conhece o lado da advocacia (presidiu o Conselho Federal da OAB). Tem vivência nos outros braços que movimentam o monopólio oficial da Justiça, na Polícia Federal e na Polícia Rodoviária Federal. Estão na órbita de suas competências condutas tão diversas como a proteção de testemunhas e dos direitos humanos e a burocrática expedição de cartas rogatórias para diligências no exterior. Soma a verificação do direito a indulto aos presos no Brasil até providências de extradição concedida pelo Supremo Tribunal Federal a pedido de governos estrangeiros, de que a ida da cantora Gloria Trevi para o México foi exemplo claro. Estão a seu cargo ainda questões atinentes aos povos indígenas e, retornando à segurança pública, o combate ao narcotráfico e também o controle de armas.
O novo ministro tem trajetória diferente da que foi seguida por muitos de seus antecessores nos últimos 20 anos. Não é político profissional, como foram ou são, entre outros, Ibrahim Abi Ackel, Fernando Lira, Bernardo Cabral (este também ex-presidente da OAB), Jarbas Passarinho, Íris Rezende, Renan Calheiros. Não mostrou interesse em nenhuma posição pública, nem mesmo no honroso cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal, para o qual foram nomeados, por exemplo e no mesmo período, Paulo Brossard, Maurício Corrêa (com bela carreira na OAB) e Nélson Jobim. O ministério da Justiça é o primeiro dos ministérios nacionais, tendo precedido a Proclamação da Independência, em junho de 1822, quando o príncipe regente, dom Pedro, nomeou Caetano Pinto. Marcio Thomaz Bastos filia-se a essa bela tradição: tem cultura geral, conhecimento técnico e experiência para dignificar o cargo.


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