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SAÚDE
Profissionais acreditam que a atividade seja um "dom de Deus", mas lutam para ser reconhecidas pelo sistema de saúde
Parteiras querem que SUS pague trabalho
AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
As parteiras tradicionais nunca
cobraram pelo trabalho de "puxar
criança", um dos nomes que dão
ao ato de ajudar no parto. Elas dizem que "partejar" é um "dom de
Deus" e se contentam com uma
galinha ou frutas de "lembrança".
As parteiras continuam pensando assim, mas querem agora que
esse "dom" seja reconhecido pelo
sistema de saúde, e que sejam pagas por isso. A tabela do SUS (Sistema Único de Saúde) prevê o pagamento de R$ 13,75 pelo procedimento de "assistência ao parto
por parteira", quando devidamente notificado -em maternidade, o parto mais simples custa
R$ 290 aos SUS.
O pagamento dos partos em casa é encaminhado aos municípios
por meio do "PAB variável", o
Plano de Assistência Básica que
incentiva as ações de saúde do
município. O dinheiro, no entanto, só chega às parteiras se a prefeitura fizer isso.
"Só alguns municípios, além do
Estado do Amapá, estão pagando
as mulheres que fazem o parto",
diz Suely Carvalho, coordenadora
da Rede Nacional de Parteiras
Tradicionais e ela própria parteira
na região de Recife e Olinda.
Estima-se que existam no Brasil
60 mil parteiras tradicionais, 40
mil delas nas regiões Norte e Nordeste. A rede nacional já participou da criação de 38 associações
que reúnem essas mulheres.
Não se tem idéia de quantos
partos as parteiras fazem por ano
no Brasil. O que se acredita, a partir de dados oficiais, é que 12% a
15% de todos os partos ocorram
fora dos hospitais. "Considerando que 3 milhões de crianças nasçam por ano no país, seriam cerca
de 400 mil partos domiciliares",
diz Suely. A R$ 13,75 o parto, seriam mais de R$ 5 milhões anuais
que poderiam estar chegando às
parteiras, afirma a coordenadora.
O pagamento pelo parto -e o
reconhecimento desse trabalho
em casa- é uma das principais
reivindicações do encontro nacional que as parteiras irão realizar
no início de junho, em Brasília,
dentro da Conferência Nacional
da Mulher.
Na floresta
A parteira tradicional costuma
ser uma líder na comunidade, sabe preparar "remédios" com ervas e muitas são procuradas para
todo tipo de problema. "Ela
acompanha a mulher durante toda a gestação. Quando a criança
está prestes a nascer, ela se muda
para a casa, acompanha o parto e
passa a se ocupar de todo o trabalho da casa, lavando, cozinhando.
Fica ali ainda por vários dias", diz
Viviane Brochardt, da ONG Cais
do Parto, de Olinda.
O Cais do Parto participou do
projeto "Parteiras Tradicionais
do Amapá", que o governo daquele Estado desenvolve desde
1995. Hoje, fazem parte do projeto
o Grupo Curumim, do Recife, e o
Unicef de Belém, órgão das Nações Unidas para a educação.
O projeto já reciclou 1.373 parteiras que, além de curso e um kit
-com lanterna e balança- , ganham meio salário mínimo por
mês. Elas aprendem noções básicas sobre reprodução, saúde da
mulher e higiene.
Os "professores" são orientados
por dois manuais feitos pelo Ministério da Saúde em parceria
com o Grupo Curumim, "Livro
da Parteira" e "Trabalhando com
Parteiras Tradicionais".
"Os livros têm muitas ilustrações, pois a maioria delas não sabe ler", diz Tania Lago, coordenadora do programa da mulher
dentro do ministério. Nos últimos
dois anos, já foram treinados parteiras e multiplicadores em quase
todos os Estados do Norte e do
Nordeste, além de Minas Gerais.
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