São Paulo, quinta-feira, 11 de março de 2004

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SEGURANÇA

Acusados por PMs de envolvimento com traficantes, adultos ficaram seis meses na prisão e menores foram levados à Febem

Família presa diz ter sido vítima de vingança

DA REPORTAGEM LOCAL

Foram seis meses de agonia. Os adultos presos e os menores dependendo dos vizinhos para comer. No final, o reconhecimento do erro pela Justiça, mas também o trauma pela humilhação, o preconceito e o desemprego.
A vida de uma família no Cingapura São João, no Parque Novo Mundo, mudou drasticamente no dia 12 de fevereiro de 2001, quando PMs entraram no conjunto habitacional com um mandado coletivo de busca e apreensão.
Os PMs dizem ter encontrado 345 gramas de cocaína em um guarda-roupa da família. Pai, mãe e genro foram para a prisão. Dois jovens foram para a Febem (Fundação do Estadual do Bem-Estar do Menor) e liberados depois.
Desde o início, a família negou ligação com traficantes e afirmou se tratar de uma retaliação de policiais militares, que teriam forjado a prova.
Segundo M.L.H., 48, mãe de quatro filhos, os policiais prometeram se vingar quando, 20 dias antes, ela liderou moradores a resistir a uma ação supostamente arbitrária da PM no local.
Um das filhas do casal, a única que estava em casa no momento da invasão, diz que um PM entrou com um sacola plástica semelhante a que foi encontrada no guarda-roupa com cocaína.
"Foi a maior humilhação da minha vida", diz J.M.S., 59, o pai da família, que presenciou a megarrebelião dos presídios paulistas, em fevereiro de 2001. "Corria de um lado para outro, não sabia o que fazer. Dois presos morreram onde eu estava."
Pai, mãe e genro conseguiram liberdade provisória em agosto de 2001. O julgamento do mérito e a inocência veio em 2002. O pai perdeu o emprego de metalúrgico em uma empresa, passou a sofrer de hipertensão, teve dois derrames e hoje recolhe papelão, contrariando recomendações médicas.
O genro, que tem 23 anos, está desempregado. "Ninguém quer contratar um ex-preso, mesmo sendo inocente", diz J.M.S.
A família não denunciou o caso por medo, mas agora pretende entrar com uma ação por danos morais contra o Estado.
Sentença da 25ª Vara Criminal de São Paulo, que inocentou a família, questionou inclusive a ação policial, que usou um mandado coletivo de busca e apreensão para revistar 620 casas.
Segundo o juiz aposentado e doutor em direito penal Luiz Flávio Gomes, o mandado coletivo é totalmente ilegal, apesar de alguns juízes já o terem concedido. "Engraçado que só é usado para locais pobres. Se o juiz autorizar em áreas nobres, vai ser processado por abuso de autoridade."
(GILMAR PENTEADO)


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