|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Vítimas da pílula de farinha tiveram filhos sem arrependimento
Há uma década, mulheres se tornaram mães sem querer após terem ingerido anticoncepcional que não fazia efeito
À época, o laboratório admitiu que, em vez de hormônio, as pílulas foram feitas de farinha para testar novas máquinas
ROBERTO DE OLIVEIRA
DA REVISTA DA FOLHA
Pablo, 10, Isabela, 9, Paulinha, 9. Quatro crianças que
nasceram entre 1998 e 1999 de
gestação não planejada, embora todas tenham crescido cercadas de amor e cuidado. As
mães se viram protagonistas
involuntárias de um escândalo
que mobilizou a sociedade brasileira há uma década: um lote
do anticoncepcional Microvlar,
contendo farinha, foi comercializado por engano.
Surpreendidas, elas optaram
por levar adiante a gravidez e
não se arrependem. "Foi muito
difícil ter um bebê num momento em que não esperava
nem podia. Mas amo muito minha caçulinha", diz a dona-de-casa Vanda Maria Bruini, 42,
mãe de Isabela.
À época, o laboratório admitiu que, em vez de hormônio, as
pílulas foram feitas de farinha
para serem usadas como teste
de novas máquinas, mas foram
extraviadas e comercializadas.
Cerca de 2 toneladas de pílula
sem efeito anticoncepcional foram produzidas.
As famílias tiveram que
aprender a lidar com as repercussões cotidianas do escândalo, de modo a não deixar que a
pílula de farinha continuasse a
causar mais danos.
Até hoje o estudante Pablo
ainda não entende direito uma
brincadeira dos coleguinhas da
época do prezinho. Na hora do
lanche, as crianças começavam
a chamá-lo de ""neném de farinha". Depois de ouvir a primeira referência explícita ao caso,
ele chegou em casa e quis saber
foi o motivo do tal apelido, motivado por uma reportagem de
TV. "Farinha do quê? De bolacha?", perguntou o menino.
Desde aquela tarde de verão
de 2003, a mãe de Pablo, a manicure Renata Ramon Mingorance, 34, vem, a conta-gotas,
tentando explicar a razão da alcunha. "As pílulas, filho, que a
mamãe tomava para não ter bebê, continham farinha. Não
medicamento."
Outro cuidado importante é
deixar claro a diferença entre
uma gravidez inesperada e uma
indesejada. "Não posso maquiar essa história maluca. Mas
reafirmo o tempo todo que a família é apaixonada por ela", diz,
emocionada a advogada Adriana Lopes da Silva, 38, mãe de
Paulinha, uma dos filhas do
"baby boom" de farinha.
Texto Anterior: Há 50 anos Próximo Texto: Saúde/Gravidez: Ser mãe exige cuidados com alimentação e vacinas Índice
|