|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MARILENE FELINTO
Adolescência e morte nos governos FHC/Alckmin
Já deu tempo de nascer e de
morrer para os adolescentes
homens brasileiros. A vida não é
politicamente correta -e o mundo piorou a passos largos. Os rapazes caem feito moscas, assassinados todos os dias nas periferias,
pobres ou ricos como o tenista
Thomás Engel, morto aos 16 anos
pela polícia em Porto Alegre, na
semana passada. Morto por nada, vítima do "plano de segurança nacional" do governo Fernando Henrique.
Um plano que não passou de
anúncio de mídia. A insegurança
nacional e a violência só fizeram
piorar em graus alarmantes nesse
governo, que sai deixando mais
pobre quem já era pobre. Irritante
mesmo no PSDB do presidente da
República ou do governo de São
Paulo é a postura de "gentlemen"
que tentam emplacar. Mas eles
são tão truculentos quanto as polícias brasileiras. E gostam mesmo é de mídia. Não é à toa que o
deputado Aécio Neves, presidente
da Câmara, tentou aprovar no
rastro do "pacote ético" R$ 8 milhões para os deputados gastarem
com anúncios de propaganda.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, é outro exemplo.
Ele não salvaria o perueiro que,
escondido embaixo da cama do
avô, foi metralhado pela polícia
na semana passada. Perueiro pobretão, não oferecia nenhum
show a la Silvio Santos para o país
e o mundo verem.
O governador não é justo, nem
a mídia é justa. Absurdo que certas camadas da sociedade se acostumem caladas com tão pouco.
Justiça, afinal, é um conceito que
se refere à equidade e ao processo
de as pessoas conseguirem aquilo
que merecem.
É o mesmo Alckmin que não se
importa com os meninos que dormem amontoados nos prédios da
Febem paulista: dormem no
chão, debaixo de bancos e mesas;
são obrigados a dormir de lado,
para dar espaço aos outros; não
podem se virar, mal respiram.
Como pode uma autoridade
aceitar calado a situação da Febem? Alckmin herdou de Mário
Covas esse caos -que herdou de
Maluf, que herdou de Fleury, que
herdou de toda a lista de criminosa irresponsabilidade anterior-
e continuou indiferente.
Fernando Henrique se gabou,
outro dia, de que seu governo tem
feito uma verdadeira revolução
social silenciosa no país. Mas não
existe revolução silenciosa. Revolução que merece esse nome faz
muito barulho -mais do que as
balas que fuzilam os adolescentes
pelas ruas dos grandes centros urbanos todo dia.
Não há nada de romântico na
adolescência. Desde os primórdios das sociedades industriais,
ela deixou de ser vista como um
mero processo de amadurecimento biológico. Tornou-se um produto da organização social. A puberdade foi esticada até depois
dos 20 anos, de modo que os jovens não entrem cedo no mercado de trabalho para disputar as
vagas com os adultos. Os meninos
da roça, pelo contrário, não têm
adolescência, trabalham desde
sempre.
Resta o consolo de que os adolescentes são fortes por natureza.
"Transgredir normas e regras estabelecidas é a verdadeira expressão da liberdade e somente os fortes são capazes dessa ousadia",
diz, lá num trecho sobre a moral
racionalista, a filósofa Marilena
Chauí. "Para disciplinar e dobrar
a vontade dos fortes, a moral racionalista, inventada pelos fracos,
transformou a transgressão em
falta, culpa e castigo. A sociedade,
governada por fracos hipócritas,
impõe aos fortes modelos éticos
que os enfraqueça, e os tornem
prisioneiros dóceis da hipocrisia
da moral vigente."
Os fortes vagam sós pelas cidades. Os fracos se unem, arranjam
conchavos, pactos de silêncio que
preservem suas vidas hipócritas,
seus casamentos hipócritas, seus
governos hipócritas. Os fracos é
que são felizes.
E-mail - mfelinto@uol.com.br
Texto Anterior: Para secretaria, bombas em DPs não são caseiras Próximo Texto: Trânsito: Duas ruas do Jd. Macedônia mudam de mão Índice
|