São Paulo, domingo, 11 de outubro de 2009

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Incentivados pelos pais, crianças se tornam aprendizes de gourmet

Elas frequentam restaurantes sofisticados na capital e apuram o paladar em viagens gastronômicas, sempre fugindo da dupla hambúrguer e cachorro-quente

ANA PAULA BONI
DA REVISTA DA FOLHA

"Humm, adoro pato. Sempre gosto de pedir o magret, com aquele molho. Como é mesmo o nome?" Marina Cheng Pereira abre um sorriso ao lembrar do prato degustado recentemente no restaurante La Brasserie Erick Jacquin, em Higienópolis, com molho rôti. À base de carne e vinho, o caldo concentrado rega finas fatias de um peito de pato malpassado, que chega à mesa com sua capa de gordura também quase crua.
Apesar dos dez anos, Marina ostenta um paladar de adulto. A primeira vez que experimentou magret foi aos seis anos e, aos quatro anos, já tinha provado escargot.
A lista do que Marina experimentou é grande -sopa de barbatana de tubarão, steak tartar, pekin duck, sashimi, sukiyaki ("você mergulha a carne no ovo cru e fica muito bom").
Os gostos gastronômicos fazem da garota paulistana parte de uma turminha diferente. São crianças que não querem mais saber de cardápio infantil.
Estimulados pelos pais, esses pequenos gourmets são apresentados a um vasto mundo gastronômico.
De restaurante em restaurante, Giancarlo Cappelli Wong, 7, sempre quer ir no Tatini, nos Jardins. "A gente vai até demais lá. O Gian adora um prato que é feito à mesa", diz a mãe, a consultora imobiliária Carla von Gabriel Wong. Viciado em comida italiana, o menino fica hipnotizado quando chega seu prato preferido: ravióli de carne à moda.
Se não for no Tatini, onde até os garçons sabem o que ele come, Gian gosta de dar uma espiada no menu. "Leio primeiro as massas, depois as saladas e a sobremesa." Nada do cardápio infantil. E Giancarlo tem apenas sete anos.
Mas, os pais também devem ser os responsáveis por apertar o freio, frisa a professora Maria Angela Barbato Carneiro, coordenadora da Brinquedoteca da PUC-SP. "É bem interessante a criança ter um paladar mais apurado, mas os pais devem observar se elas comem demais."

Pé na cozinha
Não é uma relação obrigatória, mas algumas dessas crianças adquirem também gosto pela cozinha.As irmãs Camila e Julia di Gianni Mora Valdesoiro, por exemplo, passaram a frequentar aulas de culinária. O primeiro curso foi na Escola Wilma Kövesi de Cozinha.
As aulas, conta Betty Kövesi, que pilota o curso há 18 anos, são uma boa oportunidade para a meninada perder preconceitos, porque conhecem ingredientes e acompanham a transformação dos alimentos.
Com receitas debaixo do braço, no Natal, é a vez de cada uma fazer um prato. "Eu faço torta de palmito", conta Camila, 11. A sobremesa fica por conta de Julia, 14: cheesecake com geleia de framboesa.
Esse tipo de experiência gastronômica em casa, afirma a terapeuta de família Magdalena Ramos, traz mais benefícios para a criança que a ida a restaurantes. "Não acho que seja um programa para uma criança de sete anos ficar duas horas sentada num lugar que exige um comportamento de adulto."
De acordo com a terapeuta, os pais devem ficar atentos para levar os filhos para o ambiente infantil, em vez de só puxá-los para o mundo dos adultos.

Joelho de porco
A internacional Marina, que ostenta no passaporte carimbos de viagens gastronômicas por países como Japão, Alemanha e França, gosta de se arriscar. Em Paris, há dois anos, encarou uma opção à primeira vista indigesta. "Quando entramos, um velhinho comia joelho de porco com lentilhas."
Ela pediu o prato e a opção foi seguida também pelos pais. "Era tão bom que numa segunda viagem voltamos lá", conta Marina, que torce o nariz para o feijão servido na escola. "Ela é muito exigente", diz a mãe Ramona. "Pode ser arroz e feijão, mas tem que ser benfeito."


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