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URBANIDADE
Emprego da onda
GILBERTO DIMENSTEIN
COLUNISTA DA FOLHA
Gregório Motta era, até
pouco tempo, mais um
candidato ao desemprego. Há
seis anos, ele optou pelo curso de
desenho industrial, indeciso sobre se queria mesmo entrar naquela faculdade. Não conseguia
ver como, uma vez formado (se
fosse até o final), ganharia dinheiro. Parecia-lhe desperdício
de energia desenhar produtos
comerciais para ser fabricados
em série. Amedrontava-lhe a
perspectiva de usar roupas formais; só gostava de andar de camiseta, bermuda e sandália ou
tênis. Tinha pavor especialmente da rotina e de ficar recebendo
ordens. Gregório chegou nesta
semana a uma praia do Havaí,
certo de que encontrou um jeito
de sobreviver, sem precisar mudar.
Salvou-se porque desde pequeno acompanhava o pai, Carlos
Motta, designer de móveis e surfista, pelas mais diferentes praias
do mundo, do litoral de São Paulo até a Indonésia. "Viajar pelo
mundo era encontrar praias".
Como era previsível, virou um
surfista.
Além de seguir a paixão paterna pelo mar, ele prestava atenção nos móveis que o pai construía numa marcenaria. "Não
tinha imaginado que, ao entrar
na faculdade, sem saber, estava
o encontro do desenho industrial
com as ondas."
Com a diploma na mão, não
sabia por onde começar. Como
viajava para o Havaí apenas para se divertir nas ondas, conheceu algumas oficinas em que se
produziam pranchas artesanais.
Não lhe parecia difícil fazer
pranchas, e aceitou encomendas
de amigos surfistas. Pouco a
pouco foi ganhando clientes.
"Não me incomodava perder
tempo em cada prancha, queria
mesmo um trabalho artesanal."
No ano passado, montou seu
próprio ateliê, para atender os
poucos pedidos.
Em outubro, com a proximidade das férias, sem que tenha
feito nenhum plano de negócios
e despreocupado com margens
de lucro, percebeu que já não dava conta do crescente número de
encomendas. "Prefiro não mudar de ritmo."
Nem mudou seu plano de passar as férias no Havaí. Desta vez,
porém, vai gastar todo o tempo
surfando e se divertindo, mas
também estudando: conseguiu
estágio na oficina de um dos
maiores designers de pranchas
de surfe do país. A certeza do encontro com de seu talento apresentou-lhe uma novidade: a de
que trabalhar dá prazer. "Encontrei a minha onda na vida."
E-mail - gdimen@uol.com.br
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