São Paulo, sábado, 12 de junho de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO

É necessário acabar de vez com o fantasma de 1968

EUNICE DURHAM
ESPECIAL PARA A FOLHA

É necessário que a comunidade universitária se convença que os movimentos grevistas de funcionários que vem ocorrendo, tão regularmente como as festas de fim de ano, são intoleráveis.
Não se trata mais de greve, isto é, ausência coletiva de uma categoria para a satisfação de uma reivindicação justa. A força de uma greve no sentido de impor o atendimento de suas demandas depende de uma adesão maciça e da paralisação das atividades normais da instituição.
O que acontece regularmente nos últimos anos é que os movimentos não conseguem a adesão necessária e a USP segue funcionando.
Incapaz de mobilizar a categoria, o movimento apela para ações violentas e ilegais. Piquetes que tentam impedir que docentes e servidores não grevistas tenham acesso a prédios ferem uma cláusula pétrea da Constituição, o direito de ir e vir.
A violência dos piquetes é um ato criminoso. Quando mesmo os piquetes não impõem a paralisação, apela-se para a invasão de prédios.
A invasão e depredação de patrimônio público também constitui crime. Não pode uma instituição que lutou pela democracia tolerar ações ilegais, especialmente quando praticadas por grupos minoritários engrossados por militantes políticos de dentro e de fora da USP.
As intenções das ações são óbvias. A primeira é chamar a atenção da imprensa e causar a falsa impressão de que há uma revolução em curso na universidade. A segunda é forçar a universidade a chamar a polícia e, no confronto, produzir "mártires" capazes de comover a opinião pública, posando como vítimas de violência policial arbitrária.
Levanta-se então o fantasma de 1968 , quando as forças do regime militar invadiram o campus, prendendo estudantes e docentes, ação esta que se somou a ações rotineiras, que ocorriam fora do campus, de prisão e tortura de professores e alunos.
Os grevistas tentam ilegitimamente se cobrir com o manto do heroísmo dos que lutaram contra a ditadura.
É preciso enterrar este fantasma. Em primeiro lugar, porque não se trata mais de lutar contra um regime militar opressivo em nome do qual muitos sacrificaram suas vidas. Em segundo lugar porque uma coisa é a invasão do campus pela forças armadas; outro, muito diferente, num regime democrático, é solicitar à Justiça a reintegração de posse. Se a decisão de Justiça não for acatada, configurando mais um desrespeito à lei, só resta chamar a polícia para restaurar a ordem no campus.
É entretanto o fantasma de 1968 e a confusão entre invasão militar e presença solicitada da polícia, que paralisa os docentes e os leva a tolerar ações que, em qualquer outro contexto, seriam inaceitáveis. Se o prédio da Reitoria e do COSEAS estão ocupados, o único caminho legítimo é reivindicar judicialmente a reintegração de posse e, se a ordem da justiça for desrespeitada, solicitar a intervenção da polícia como ocorre em sociedades democráticas.
Quanto às reivindicações dos funcionários, de isonomia de aumento em relação àquela concedida aos professores, elas não procedem.
Na última gestão os servidores foram beneficiados com aumentos, promoções e benefícios que os docentes não receberam. Hoje, ganham mais na USP do que receberiam em empregos fora dela. Com os professores acontece o contrário -estão ganhando menos que docentes de outras universidades públicas e muito menos do que outros funcionários públicos de qualificação igual ou menor. Sem um aumento diferencial para os docentes a USP fica ameaçada de perder quadros qualificados e dificilmente substituíveis.


EUNICE RIBEIRO DURHAM é pesquisadora do núcleo de políticas públicas da USP


Texto Anterior: 37 estudantes pró-greve param Paulista
Próximo Texto: Só vale-alimentação garante comida na mesa, diz servidor
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.