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JUSTIÇA
Acusados de matar o assaltante Sandro do Nascimento foram absolvidos por 4 votos a 3; Ministério Público recorre
Júri livra policiais do caso do ônibus 174
Marco Antônio Rezende/Folha Imagem
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Os policiais Dias, David e Soares no julgamento do assalto ao ônibus da linha 147, no Rio |
FERNANDA DA ESCÓSSIA
TALITA FIGUEIREDO
DA SUCURSAL DO RIO
Depois de 20 horas de julgamento, foram absolvidos ontem
pelo 4º Tribunal do Júri, por 4 votos a 3, os três policiais militares
acusados da morte de Sandro do
Nascimento, conhecido como o
sequestrador do ônibus 174.
O Ministério Público, que considera haver provas de que Sandro foi assassinado, recorreu ao
TJ (Tribunal do Júri), pedindo novo júri popular para o capitão Ricardo de Souza Soares e para os
soldados Flávio do Val Dias e
Márcio de Araújo David. À época
do sequestro, em junho de 2000,
eles integravam o Bope (Batalhão
de Operações Especiais), o grupo
de elite da PM (Polícia Militar).
Segundo o boletim hospitalar e
o laudo do Instituto Médico Legal, Sandro morreu dentro de um
carro da PM, de asfixia causada
por estrangulamento. Tinha 21
anos. O sequestrador entrou vivo
e desarmado no camburão, imobilizado pelo capitão e pelos soldados. Chegou morto ao hospital,
com marcas no pescoço.
Para o advogado de defesa, Clóvis Sahione, 65, Sandro "sufocou-se". Nos debates, ele chegou a defender a pena de morte para o que
classificou de "bandidos sem solução". "Criminoso tem de morrer. Eu mato, sim. Se estuprar
uma filha minha, vai morrer. O
resto é hipocrisia", afirmou.
Os quatro jurados que votaram
pela absolvição aceitaram que
houve morte, mas não homicídio,
acatando as duas teses da defesa:
Soares sufocou Sandro para imobilizá-lo, mas não apertou seu
pescoço; o sequestrador, quando
reagiu à tentativa de imobilização,
fez movimentos que provocaram
sua asfixia e a consequente morte.
O advogado apresentou em vídeo o parecer do legista Roberto
Blanco, da Universidade Candido
Mendes, de que era possível que
Sandro tivesse provocado a própria morte. A explicação foi inaudível, por motivos técnicos.
Para o Ministério Público, a decisão dos jurados é "a volta à barbárie" e o reconhecimento do direito da polícia de matar.
"Pelo que ficou decidido, parece
que Sandro se suicidou, morreu
de infarto, pneumonia. Ele se asfixiou sozinho? Ninguém nega que
Sandro era um criminoso. Teria
que ser punido, não morto", disse
o promotor Afrânio Silva Jardim,
52, após o julgamento.
Em 12 de junho de 2000, Sandro
sequestrou um ônibus da linha
174, no Jardim Botânico (zona
sul), e manteve dez pessoas reféns
por quatro horas e meia. Ele era
sobrevivente da chacina da Candelária, em 23 de julho de 1993,
em que oito meninos de rua foram assassinados por PMs.
Quando Sandro saiu do ônibus,
com uma das reféns, a professora
Geísa Firmo Gonçalves, sob a mira de seu revólver, um PM fez três
disparos contra ele. Errou, permitindo que Sandro matasse Geísa,
21, grávida de dois meses.
O capitão disse que, no carro,
deu uma "gravata" no pescoço de
Sandro, para imobilizá-lo. Negou
ter apertado o pescoço e disse que
não tinha a intenção de matar. Os
soldados disseram que seguravam braços e pernas de Sandro.
Para o legista Nelson Massini,
professor da UFRJ (Universidade
Federal do Rio de Janeiro), nos casos de asfixia por "gravata", o determinante para a morte é a pressão externa sobre o pescoço.
"Com dois minutos, a pessoa desmaia. Com três, tem morte cerebral. Com seis ou sete, pára de respirar. É uma morte cruel."
O ponto mais explorado pela
defesa foi o medo da sociedade
diante da violência: "Temos, de
um lado, Sandro e os marginais;
de outro, esses homens [os PMs" e
a sociedade. Se eles forem condenados, só os marginais baterão
palmas", disse Sahione.
A acusação inicial era de homicídio duplamente qualificado, por
causa do meio utilizado (asfixia),
considerado cruel, e da impossibilidade de defesa da vítima. A pena seria de 12 anos a 30 anos.
A Promotoria ainda minimizou
a acusação, pedindo só a condenação por homicídio doloso, sem
os qualificativos e atenuado por
violenta emoção. Assim, a pena
seria de quatro anos. "Colocá-los
por 20 anos na prisão não vai ressuscitar o Sandro. Agora, a população não vai acreditar em história
da carochinha de que foi "suicídio
culposo'", disse o promotor.
Com a leitura da sentença, às
5h47, parentes e amigos dos PMs
comemoraram com choro e abraços. Não havia no plenário parentes ou amigos de Sandro.
O recurso por novo júri deverá
ser apreciado em 2003.
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