São Paulo, domingo, 12 de dezembro de 2010

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Resgatado pelo Samu agora ajuda vítima

Na maior central de emergências da América Latina, todos os 90 atendentes têm algum tipo de deficiência

Boa parte teve primeiro contato com o serviço quando precisou dele; eles entendem bem a importância da rapidez
EMILIO SANT'ANNA
DE SÃO PAULO

Bastou um segundo de desatenção para que se seguissem 25 dias em coma e sete anos de reabilitação. Após uma queda que lhe tirou os movimentos do lado direito do corpo, o ex-taxista Paulo Braz, 47, poderia contar a vida com esses números.
Há um ano e três meses, no entanto, sua trajetória tem números melhores.
O ex-taxista se tornou um dos 90 atendentes-todos com algum tipo de deficiência física-da central do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), no Bom Retiro, região central de SP.
Ao seu lado estão pessoas que nasceram com algum tipo de deficiência e outras, que como ele, tiveram que se adaptar às dificuldades.
Alguns dos atendentes são ex-bombeiros e ex-policiais cadeirantes- feridos em serviço e resgatados pelo próprio Samu.
Na maior central de emergências da América Latina, Paulo recebe algumas centenas das mais de 9.000 ligações diárias para o número 192. Trabalha, diz ele, para evitar que outros contem os anos como ele contou.
Com gestos lentos e a fala baixa, a sequela mais visível de seu acidente é um andador que o ajuda a circular pela central do Samu.
"Estava na escada e joguei o corpo para trás- por brincadeira-, para me segurar no corrimão", diz. "Depois, não lembro de mais nada." Paulo passou seis anos longe do mercado de trabalho, enquanto "as contas iam se acumulando".
Seu segundo "resgate", conta, veio por meio de um programa da Avape (Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência).
A instituição mantém um convênio com a Secretaria Municipal de Saúde para treinar e encaminhar os atendentes do Samu.
Segundo o coordenador da gerência hospitalar da secretaria, Paulo Kron, a experiência-iniciada em 2009- revelou resultados melhores que os esperados.
"Essas pessoas viveram na pele a importância do atendimento de urgência", explica.
"Sei a diferença que faz um minuto no atendimento de quem, por exemplo, sofre um traumatismo craniano, como eu sofri", diz Paulo.
Na central, essa certeza é compartilhada entre todos.
Thiago Rodrigo dos Santos é operador de despacho- responsável por enviar as ambulâncias para o local do resgate. De seus 29 anos, um foi passado em uma cama, sem poder se mexer.
Thiago trabalhava como vendedor e em um dia de chuva perdeu o controle do carro. Foi resgatado pelo Samu. "Quebrei a C6 e C7 [vértebras].Tinha 28 anos, um filho de 12 e o INSS não estava mais me pagando", diz.

DEFICIT
Mais difícil que recuperar os movimentos, pode ser voltar a trabalhar e produzir.
Segundo dados da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Trabalho, cerca de 4.500 pessoas com deficiência foram recolocadas no mercado de trabalho na cidade de São Paulo entre 2005 e 2010.
Com base nos dados do IBGE, estima-se que mais de 1,5 milhão de pessoas com deficiência vivam em São Paulo.
Marcos Belizário, secretário Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida, reconhece o deficit, mas vê progressos, como o do Samu. "Ainda falta muito, mas estamos criando a cultura da inclusão."


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