São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 2000


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SAÚDE
Tuberculose, mais resistente, exige cuidados

ALCINO BARBOSA JR.
especial para a Folha


Uma velha conhecida dos médicos faz cada vez mais vítimas fatais no município de São Paulo. As mortes por tuberculose aumentaram 30% desde 1986.
Apesar de acompanhar a humanidade há milhares de anos, a tuberculose só recebeu o primeiro tratamento eficiente na década de 50. E agora, na virada do século, aumentam os casos de resistência aos remédios tradicionais.
Segundo Vera Galezzi, coordenadora do programa de tuberculose do Centro de Vigilância Epidemiológica de São Paulo, os diagnósticos demorados são uma das causas do aumento no número de mortes..
"O número de casos de tuberculose não está aumentando, mas o diagnóstico tem sido feito tardiamente e, por isso, cresce a mortalidade", diz Vera.
Denise Schout, diretora do Serviço de Epidemiologia do Hospital das Clínicas, concorda. "A falha da rede de atenção primária e secundária em tratar os doentes de tuberculose faz com que muitos casos se agravem e se tornem crônicos."
No restante do país, "também existe uma tendência de aumento da mortalidade", afirma o coordenador nacional de pneumologia social, Antônio Ruffino Netto.
O número de casos de tuberculose notificados ao Ministério da Saúde no Brasil é da ordem de 83 mil por ano. "Estimamos que o número real de casos chegue a 129 mil", disse Ruffino Netto.
Isso significa que apenas 64% dos casos de tuberculose no país chegam ao conhecimento do governo. Para o número de mortes, o valor é semelhante. São notificadas 6.000 mortes por tuberculose a cada ano. Estima-se que o número total seja de 10 mil mortes.
"Nossa meta é diagnosticar 92% dos casos até 2002. Esperamos também reduzir o número de casos pela metade, e de mortes para um terço do atual, até o ano 2009."
Para atingir esse objetivo, a estratégia do ministério é investir na busca de novos doentes, diagnosticar precocemente a doença e tratar os pacientes.
O aumento das mortes por tuberculose é considerado consequência de vários fatores. "A desigualdade social que se agravou no país colabora para o aumento das doenças relacionadas à pobreza", acredita Ruffino.
A epidemia de Aids também tem seu papel, porque o paciente HIV positivo é mais suscetível à tuberculose.
Outro fator são os movimentos migratórios dentro do país. "Além de levar consigo o bacilo para outras regiões, o migrante é mais sujeito a contaminação, pois, por motivos de estresse, seu sistema imunológico é mais vulnerável."
Segundo Ruffino, o Ministério adotou o programa de "tratamento supervisionado". Os doentes são acompanhados diretamente, inclusive com visitas domiciliares, para evitar que abandonem o tratamento.
Antes o modelo de tratamento era conhecido como auto-administração, em que somente o doente era responsável pela tomada da medicação.
Os municípios estão recebendo bônus do ministério para cada caso curado de tuberculose. Essa verba é destinada ao Fundo Municipal de Saúde e deve ser utilizada somente no combate a tuberculose dentro do município.
Para cada doente curado pelo programa de tratamento supervisionado, o município recebe R$ 150. Se o paciente foi tratado com sucesso pelo método de auto-administração, o valor cai para R$ 100.
Ruffino afirma que "até o ano 2001 as ações do governo aparentemente não vão mostrar muitos resultados, porque, com a melhora do serviço de notificação, os números de casos e de mortes vão aumentar e só daqui a quatro anos devem começar a cair".
Em São Paulo, dez das 24 diretorias regionais de saúde adotaram o tratamento supervisionado. Atualmente, a taxa de cura no Estado é de 65% dos pacientes. "Com a supervisão dos doentes, devemos alcançar 85%. O ideal seria mais do que 90%", afirma Vera Galesi, do Centro de Vigilância Epidemiológica.
O número de mortes por tuberculose no Estado de São Paulo mantinha-se em declínio até o início dos anos 80 por causa da melhoria da qualidade de vida. "Mas o ano de 1985 foi um divisor de águas", disse Vera.
Para ela, os motivos do ressurgimento da doença foram a epidemia de Aids, que torna os pacientes mais suscetíveis à infecção pelo bacilo da tuberculose, a diminuição dos programas de controle da doença e o empobrecimento de certas populações.
"Infelizmente, quando os políticos vêem uma doença em declínio, eles suspendem os programas de controle em vez de continuar até a erradicação da doença", afirma Vera.
Nos países industrializados, a tuberculose é considerada uma doença reemergente. "Foram registrados surtos epidêmicos da doença em Nova York e em grandes cidades do leste europeu", disse Denise Schout, do Hospital das Clínicas.
Nos Estados Unidos, o programa de tratamento supervisionado foi utilizado com sucesso entre os sem-teto de Nova York.


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