São Paulo, domingo, 13 de fevereiro de 2005

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PATRIMÔNIO ESQUECIDO

Com obras de restauro ainda em andamento, imóvel abrigará Museu da Energia de São Paulo

Casarão Santos Dumont abrirá em março

RICARDO BRANDT
DA REDAÇÃO

Esquecido na memória dos paulistanos, o casarão da família Santos Dumont, na esquina das alamedas Cleveland e Nothmann, está prestes a ser aberto ao público como museu, ainda com as obras de restauro em andamento.
Construído em 1890, o prédio pertenceu a Henrique Santos Dumont, irmão do aviador Alberto Santos Dumont. O pai, Henrique Dumont, era conhecido como "Rei do Café". A família era uma das mais ricas da época.
O casarão foi construído no Campos Elíseos, primeiro bairro planejado da cidade de São Paulo e berço da aristocracia cafeeira do final do século 19. O local era estratégico para os barões do café devido à proximidade com a estação de trem da Luz -que dava acesso ao porto de Santos e às fazendas no interior do Estado.
Desde que os membros da oligarquia começaram a deixar o Campos Elíseos, ainda nas primeiras décadas do século 20, dando espaço a hotéis, pensões e cortiços, o bairro entrou em processo de degradação gradativa.
O casarão ainda sobreviveu incólume por mais da metade do século. Depois de ser vendido pela família Santos Dumont, em 1926, o imóvel abrigou o colégio interno feminino Stafford, de 1926 a 1951, e a primeira sede da Sociedade Pestalozzi, de 1952 a 1983.
Foi a partir de então que o prédio, símbolo da riqueza gerada pelo café, passou a ser deteriorado. Os ornamentos luxuosos vindos da Europa foram parcialmente perdidos ou saqueados.
Com os portões fechados e o prédio desocupado, o espaço foi invadido três vezes por grupos de sem-teto entre 1983 e 1997.
De 1997 a 2001, o casarão abrigou cerca de 400 famílias. O antigo bairro, o primeiro a ter arruamento em São Paulo, foi ocupado por traficantes e ficou conhecido como a "Cracolândia".
Foi em 2001, quando o Estado conseguiu desocupar definitivamente o casarão e cedeu o imóvel para a Fundação Patrimônio Histórico da Energia de São Paulo, que o prédio que parecia fadado à demolição, como tantos outros casarões do século 19, começou a ser recuperado.
O complexo de prédios virará a partir de março o Museu da Energia de São Paulo, que terá como temática a história da energia ligada à urbanização de São Paulo e as fontes alternativas de energia.
Há ainda um projeto do Estado de integrar um bonde que trafegaria pela região da Luz e teria como um dos pontos finais o pátio do casarão Santos Dumont.

O renascimento
O imóvel, que foi construído pelo escritório do arquiteto Ramos de Azevedo, entrou em processo de restauração em 2001.
No terreno de 3.100 m2 há outros três prédios construídos posteriormente durante o período de colégio. Dois deles também estão em processo de restauração e outro será demolido.
Durante os anos em que foi transformado em favela, e mesmo no período em que virou colégio e entidade social, muitas das ornamentações e características arquitetônicas do imóvel foram alteradas ou danificadas.
"Os mais afetados foram o piso, tanto o de madeira como os ladrilhos, e o forro. Houve muitos focos de incêndio dentro do casarão e também a presença de cupim", explica a arquiteta Mariana de Souza Rolim, responsável pela restauração.
O casarão foi construído em estilo eclético com amplos jardins, o que já o diferenciava dos outros prédios erguidos na época em estilo colonial. A pintura decorativa que preenche as paredes de seus 13 cômodos e dois pavimentos é toda em estilo art nouveau.
No processo de restauro, todas essas pinturas decorativas foram encontradas e ainda serão restauradas numa segunda fase.
"Fizemos janelas [espécie de abertura feita retirando as outras camadas de tintas que sobrepuseram a original] para que as pessoas possam ver como eram as pinturas das paredes. A partir disso os restauradores reconstituem todos os desenhos", disse Rolim.

Dificuldades
Em setembro de 2003, o projeto de restauração foi modificado e a obra dividida em três etapas. Nesta primeira, serão entregues as restaurações do casarão (que abrigará o museu) e do segundo prédio principal (que abrigará a administração da fundação).
A divisão em etapas foi a forma encontrada pela equipe de restauro para conseguir dar prosseguimento a obra sem mais percalços.
O projeto de restauração já consumiu R$ 4 milhões. Foram R$ 1,5 milhão de fundos próprios da entidade na primeira etapa e outros R$ 2,5 milhões conseguidos por meio de parcerias com o setor privado no ano passado.
A obra, no entanto, caminhou lentamente por longo período e chegou a parar em 2003 devido a falta de verbas.
Agora, o casarão será aberto oficialmente em março ainda com a restauração inconclusa para facilitar a captação de novos recursos.
"Foi uma forma que encontramos de conseguir captar mais verba e também para poder oferecer ao público a oportunidade de conhecer como se recupera uma pintura de mais de um século", explica Rolim.
É que toda característica arquitetônica do casarão foi recuperada nesta primeira fase, mas as pinturas internas que ornamentavam o imóvel não. Elas foram encontradas e serão restauradas com o museu já aberto, o que permitirá ao público acompanhar a realização do trabalho.

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