São Paulo, segunda-feira, 13 de maio de 2002

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CENSO 2000

Entrevistados citaram cerca de 1.200 novas denominações religiosas; dados mostram crescimento de 70,7% de evangélicos

"Pulverização pentecostal" cria microigrejas

Roberto Price/Folha Imagem
O pastor Roberval Teles de Castro prega em frente à garagem de sua casa, convertida em templo


FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

O militar aposentado Roberval Teles de Castro, 65, teve de adaptar a garagem de casa para exercer sua nova atividade profissional: a de pastor evangélico.
Ex-membro da Igreja Universal do Reino de Deus e da Assembléia de Deus, Castro é hoje presidente e único pastor da Comunidade Evangélica Renascer no Amor de Cristo, que funciona em Vila Tiradentes, bairro pobre de São João de Meriti (Baixada Fluminense).
Um grupo de 35 fiéis frequenta o templo-garagem e, quando pode, paga o dízimo para ajudar na manutenção da igreja e na assistência aos mais pobres do bairro.
A pequena igreja de São João de Meriti é exemplo de um fenômeno que o Censo 2000 ajuda a medir: a multiplicação de pequenas igrejas evangélicas Brasil afora, que os especialistas definem como "pulverização pentecostal".
Os dados do Censo 2000 mostram que foram citadas cerca de 1.200 novas denominações religiosas. A antropóloga Clara Mafra, pesquisadora do Iser (Instituto de Estudos da Religião) e consultora do IBGE para o assunto, diz que, dessas, de 60% a 70% são igrejas pentecostais evangélicas.
São consideradas pentecostais igrejas que valorizam os chamados "dons do Espírito Santo", como a capacidade de orar em línguas desconhecidas (glossolalia), a cura e a profecia, além de cultos cheios de expressões de êxtase. São pentecostais, por exemplo, a Assembléia de Deus e a Igreja Universal do Reino de Deus.
A denominação pentecostal diferencia essas igrejas das evangélicas, chamadas "de missão" e instaladas no Brasil por imigrantes e missionários estrangeiros.
Na avaliação da antropóloga Regina Novaes, professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), a pulverização pentecostal multiplica no país uma característica dos evangélicos: a criação de ramificações.
"É próprio dos evangélicos pensar no seu rebanho como uma grande árvore que vai criando novos galhos", explica Novaes.
Essas novas igrejas podem ser identificadas pelos especialistas pelas denominações "pentecostais", "congregacionais" ou pelos nomes fervorosos, como "Fogo da Bíblia", "Apocalipse de Jesus" e "Subimos com Jesus".
Para Clara Mafra, a pulverização sinaliza também uma busca de cidadania por parte da população pobre -público mais frequente desse fenômeno.
"O morador sente necessidade de ter um líder próximo, como se assim exercesse melhor sua religiosidade como forma de cidadania, ajudando os outros", diz ela.
A antropóloga avalia que essas pequenas igrejas se apropriam ainda de referenciais já presentes no repertório simbólico do brasileiro, transformando-os de acordo com a nova religião. "É o caso do profeta local, da benzedeira, da rezadeira, do líder comunitário. Eles podem acabar criando suas igrejas e virando pastores."
Outra característica do avanço pentecostal no Brasil, por fim, é sua mistura com as igrejas "de missão" tradicionais, que acabam criando novos ramos e adotando denominações de "renovada".



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