São Paulo, quarta-feira, 13 de junho de 2007

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Fila para tirar passaporte dura até 13 horas

Proximidade das férias e baixa do dólar contribuíram para aumentar a demanda; lugar na fila pode custar até R$ 500

Na sede da PF em São Paulo, 600 senhas começam a ser distribuídas a partir das 8h, mas os primeiros candidatos chegam na noite anterior

PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Com os olhos inchados de sono, as irmãs Mariana e Daniela Pascowitch, de 24 e 21 anos, moradoras do Morumbi (zona sul de SP), descem de um Toyota Corolla em frente à Polícia Federal, na Lapa (zona oeste), para uma experiência inédita: pegar a fila do passaporte.
Às 7h, há cerca de 300 pessoas no local, mas as duas entram bem perto do início da fila. Conseguiram um bom lugar porque o motorista delas, João Gorga, 55, está na fila desde as 4h45. Por sua vez, Gorga rendeu um rapaz que chegou no começo da madrugada. "Não sei quanto custou, meu pai que pagou o cara", diz Mariana.
Esse foi o meio que as duas arranjaram para driblar a espera de até 13 horas imposta a quem precisa tirar o documento. Com a proximidade das férias escolares e a baixa do dólar, a situação só piorou.
Além da fila do lado de fora, o candidato ao passaporte ainda enfrenta outra espera dentro da PF, com a senha na mão.
Como são distribuídas 600 senhas por dia, o último pode esperar até cinco horas. "Nossa estimativa é que se atendam 50 pessoas por hora. Então, se você ocupa o 150º lugar na fila, nós o orientamos a pegar a senha e voltar três horas mais tarde", explica o assessor de comunicação, delegado Humberto Prisco Neto.
Com o novo modelo de passaporte, que tem ao menos 16 itens de segurança, o processamento do documento é três vezes mais lento. Mas, para o delegado, não há necessidade de chegar de madrugada. "A pessoa pode vir por volta das 7h30, pegar a senha e voltar depois."
"Estou voltando pela terceira vez", diz a estudante Chayene Pimenta, 25, às 5h de ontem. "Vim quinta, às 4h, achando que teria pouca gente por causa do feriado, e a fila tinha 400 pessoas", conta.
Com a aproximação das 8h, quando se abrem os portões, a fila vai "inchando" -há gente paga para guardar o lugar para mais de uma pessoa. "Quando cheguei eram 3h30 e eu contei 35 pessoas na minha frente. Agora são 56", diz a modelista Cibele Nogueira, 27, que foi com o irmão, Joaquim Maurício, 25, por medo de ficar só.
O delegado Prisco diz que guardar lugar na fila por dinheiro não é crime, e que fiscalizar o que acontece do lado de fora da PF não é atribuição deles. Para Prisco, "não é um problema legal, mas comportamental". "Se tem gente que vende lugar, é porque tem gente que compra, não é verdade?"
O primeiro da fila é o servente Josemas Pereira, 25, que chegou ali às 19h do dia anterior, "para guardar lugar para um tio". "A gente se ajuda muito na família", explica Pereira, que é de Aliança, Pernambuco, ganha salário mínimo e tem o sonho de viajar para bem longe de SP -de volta para Aliança.
O "tio" do servente chega cerca de 30 minutos antes da abertura do portão. De terno cinza, gravata vermelha e dois filhos, ele se recusa a falar com a Folha. Diz, constrangido, que Pereira guardou lugar para seus filhos, não para ele.
Uma vaga na fila pode custar R$ 100, R$ 300 e até R$ 500, segundo apurou a Folha. Nem todo mundo se envergonha de dizer que comprou a vaga. A norte-americana Deborah, que está ali com os dois filhos, até reclama porque a pessoa que guardou seu lugar por R$ 100 pediu que ela chegasse às 5h. "Imagina! Se eu tô pagando, quero chegar às 7h", diz.
A publicitária Nina Farina, 45, que dorme no banco de trás de sua minivan Mitsubishi, diz que teve "dó" de mandar o motorista às 4h (ele foi mais tarde). Ela comprou a vaga por R$ 300, "mas o cara vai nos acompanhar até lá dentro".
"Vim de táxi, olha a minha cara de cansaço", diz Nina, que mora no Jardim Europa.


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