São Paulo, quinta-feira, 13 de outubro de 2005

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GEOGRAFIA DA EXCLUSÃO

Após reintegrações de posse, famílias vivem em barracos improvisados na Luz e na Capela do Socorro

Despejados "favelizam" ruas na capital

LUÍSA BRITO
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma placa publicitária sobre a porta do barraco anuncia "pronto para morar". As paredes de madeira, feitas com material de propaganda de imóveis, falam em apartamentos de quatro quartos com duas suítes.
No entanto, o barraco, assim como outros 22 montados na rua Plínio Ramos (centro de São Paulo), possui apenas um cômodo. A maioria abriga mais de uma família, integrantes do MMRC (Movimento de Moradia da Região Centro) que moravam num prédio invadido na mesma rua.
Retirados por ordem judicial após terem invadido propriedades particulares, sem-teto do centro e da zona sul estão favelizando vias próximas aos locais desocupados. Na Plínio Ramos, as famílias acamparam na calçada e vivem em uma estrutura de favela, com barracos feitos de pedaços de madeira, banheiro improvisado e cozinha comunitária.
Os grupos cobram projetos habitacionais dos governos Geraldo Alckmin e José Serra (ambos do PSDB) e criticam só terem recebido a oferta de abrigos e bolsas emergenciais. Um cartaz na rua Mauá, onde já existem 41 barracos, responsabiliza as duas esferas de governo: "Aqui nasce a favela Alckmin, mais uma obra Serra".
A Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social disse que ofereceu abrigos para todas as famílias provenientes de desocupações. Segundo a secretaria, elas ficariam separadas dos moradores de rua e poderiam permanecer durante todo o dia no local. O governo estadual concedeu o benefício de R$ 250 mensais, durante um ano, para as famílias da Plínio Ramos.
No entanto, segundo os moradores, muitos não conseguem sair da rua porque não são aceitos em pensões devido à quantidade de filhos. Eles também afirmam ter dificuldade de alugar um apartamento por falta de fiador.
Se dizendo sem opção, a desempregada Simone Monteiro, 23, improvisou moradia para ela, o marido e três filhas (de 5, 4 e 3 anos) dentro de uma Brasília. Os bancos do carro foram retirados para poder comportar um colchão de solteiro no qual dorme o casal. As crianças deitam numa superfície de espuma improvisada na mala do carro. "Viver aqui é muito apertado, acordo com dor no corpo. A vantagem é que não molha quando chove. Nos barracos, fica tudo inundado", conta.
Segundo um dos coordenadores do MMRC, Nelson da Cruz Souza, o ideal é que o dinheiro fosse usado para alugar um prédio onde as famílias pudessem ficar juntas. Souza diz não ser ligado a partidos políticos.
Na rua Mauá, os barracos foram montados por sem-teto que moravam há três anos num prédio também invadido na rua Paula Souza (centro). Os moradores, que dizem não fazer parte de movimentos organizados, foram retirados do local no início do mês.
"O prefeito deveria dar o terreno para a gente fazer mutirão e construir nossas casinhas", afirmou Gabriela de Paula, 28, que está grávida de oito meses e mora num barraco na Mauá com o marido e os três filhos.
Comerciantes da região reclamam dos novos vizinhos e dizem que eles afastam os compradores. "Os clientes sentem medo, ficamos sem saber se eles vão voltar", afirmou Sueli Rocha, 29, proprietária de uma loja de venda de sal. Ela disse que, se o problema não for resolvido, não renovará o contrato de aluguel da loja, que vence no final do ano.
No bairro Capela do Socorro (zona sul), famílias retiradas de um terreno particular ocuparam uma praça e quebraram bancos e brinquedos para poder construir 36 barracos no local. Outros 40 barracos ficam numa rua próxima à praça. O líder dos moradores, Wesley Lopes, diz que a prefeitura não ofereceu abrigo.
A secretaria estadual de assistência social informou que o grupo recusou o benefício de R$ 250. Lopes nega a informação e diz que as famílias esperam o dinheiro.


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