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São Paulo, quinta-feira, 13 de novembro de 2003

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RETRATOS DO BRASIL

Cadastro de prefeituras mostra que número de habitações precárias teve aumento de 156% de 99 a 2001

Casas em favelas já chegam a 2,4 milhões

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Fenômeno com origem na migração e no empobrecimento, as favelas brasileiras têm 2,363 milhões de moradias cadastradas pelas prefeituras -um número maior do que o total de domicílios da cidade do Rio (1,802 milhão, segundo o Censo de 2000).
Divulgada ontem pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a Munic (Pesquisa de Informações Básicas Municipais), com dados de 2001, mostra que as favelas se concentram nas grandes cidades e, regionalmente, no eixo Sul-Sudeste. Segundo a pesquisa, 70% dos domicílios cadastrados em favelas -ou 1,655 milhão- estão em cidades com mais de 500 mil habitantes.
De acordo com o IBGE, 23% das cidades brasileiras declararam ter favelas ou moradias precárias semelhantes (mocambos ou palafitas). A proporção sobe para 80% nas cidades de 100 mil a 500 mil habitantes e para 100% nas com mais de 500 mil.
A pesquisa revela ainda que 36,8% das cidades do país divulgaram ter loteamentos irregulares (não obedecem a todas as regras) e 24,3%, lotes clandestinos, cuja ocupação não é informada à prefeitura. No caso dos irregulares, as cifras crescem nas cidades maiores, chegando a 93,8% nas com mais de 500 mil habitantes.
O aumento do cadastramento nas cidades maiores, segundo o IBGE, foi o principal responsável pelo crescimento de 156% no número total de domicílios em favelas registrado pelas prefeituras. Em 1999, ano da pesquisa anterior, eram 922 mil moradias cadastradas.
Todas as informações da Munic são prestadas pelas prefeituras, sem checagem posterior do IBGE. No caso dos dados de habitação, o nível de cadastramento influiu significativamente nos resultados, segundo o IBGE.
Pelos dados dos registros municipais, há no país 16.433 favelas. No Censo de 2000, o IBGE apurou um número diferente: 3.905. O total de domicílios em favelas apurado pelo censo também é bem menor: 1,663 milhão.
O IBGE informa que não investigou os motivos da disparidade, mas que o fato de o informante da pesquisa ser diferente pode explicar a contradição. Especialistas ouvidos pela Folha afirmam que o município e o censo podem adotar conceitos diferentes para favelas e moradias precárias.
Em São Paulo, um estudo feito pela prefeitura e pelo Centro de Estudos da Metrópole apontou que 464 favelas surgiram na cidade de 1991 a 2000 -uma a cada oito dias. Há três anos, elas totalizavam 2.018, onde viviam 1,16 milhão de pessoas.
Os especialistas chamam atenção para a tendência revelada pelos números das prefeituras: eles mostram que a quase totalidade do processo de urbanização nas grandes cidades ocorre por meio de moradias precárias e das ocupações ilegais do solo.
"No fundo, a urbanização tem acontecido quase que exclusivamente de forma ilegal, seja pelo crescimento das favelas ou dos loteamentos irregulares", disse Suzana Pasternak, professora da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo), da USP.
"Grande parte do aumento dos domicílios próprios ocorreu nas áreas urbanas informais, especialmente favelas, condomínios e loteamentos clandestinos", afirmou Diana Meirelles da Motta, pesquisadora do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
A migração é uma das causas da concentração de favelas nas maiores cidades, segundo o IBGE, embora o fenômeno tenha diminuído nos últimos anos. Para Dulce Pandolfi, da FGV (Fundação Getúlio Vargas), a migração provocou o "boom" das favelas no passado. Mas agora o que mais impulsiona é a redução do rendimento da população.
Urbanizá-las ou criar conjuntos habitacionais para transferir os moradores muitas vezes não resolve o problema, disse Pandolfi. "É que ele [o morador de favela] vai ter de pagar imposto, água, luz, que não pagava antes. A renda não acompanha as melhores condições de habitação."


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