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RETRATOS DO BRASIL
Cadastro de prefeituras mostra que número de habitações precárias teve aumento de 156% de 99 a 2001
Casas em favelas já chegam a 2,4 milhões
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
Fenômeno com origem na migração e no empobrecimento, as
favelas brasileiras têm 2,363 milhões de moradias cadastradas
pelas prefeituras -um número
maior do que o total de domicílios
da cidade do Rio (1,802 milhão,
segundo o Censo de 2000).
Divulgada ontem pelo IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística), a Munic (Pesquisa
de Informações Básicas Municipais), com dados de 2001, mostra
que as favelas se concentram nas
grandes cidades e, regionalmente,
no eixo Sul-Sudeste. Segundo a
pesquisa, 70% dos domicílios cadastrados em favelas -ou 1,655
milhão- estão em cidades com
mais de 500 mil habitantes.
De acordo com o IBGE, 23% das
cidades brasileiras declararam ter
favelas ou moradias precárias semelhantes (mocambos ou palafitas). A proporção sobe para 80%
nas cidades de 100 mil a 500 mil
habitantes e para 100% nas com
mais de 500 mil.
A pesquisa revela ainda que
36,8% das cidades do país divulgaram ter loteamentos irregulares
(não obedecem a todas as regras)
e 24,3%, lotes clandestinos, cuja
ocupação não é informada à prefeitura. No caso dos irregulares, as
cifras crescem nas cidades maiores, chegando a 93,8% nas com
mais de 500 mil habitantes.
O aumento do cadastramento
nas cidades maiores, segundo o
IBGE, foi o principal responsável
pelo crescimento de 156% no número total de domicílios em favelas registrado pelas prefeituras.
Em 1999, ano da pesquisa anterior, eram 922 mil moradias cadastradas.
Todas as informações da Munic
são prestadas pelas prefeituras,
sem checagem posterior do IBGE.
No caso dos dados de habitação, o
nível de cadastramento influiu
significativamente nos resultados, segundo o IBGE.
Pelos dados dos registros municipais, há no país 16.433 favelas.
No Censo de 2000, o IBGE apurou
um número diferente: 3.905. O total de domicílios em favelas apurado pelo censo também é bem
menor: 1,663 milhão.
O IBGE informa que não investigou os motivos da disparidade,
mas que o fato de o informante da
pesquisa ser diferente pode explicar a contradição. Especialistas
ouvidos pela Folha afirmam que
o município e o censo podem
adotar conceitos diferentes para
favelas e moradias precárias.
Em São Paulo, um estudo feito
pela prefeitura e pelo Centro de
Estudos da Metrópole apontou
que 464 favelas surgiram na cidade de 1991 a 2000 -uma a cada
oito dias. Há três anos, elas totalizavam 2.018, onde viviam 1,16 milhão de pessoas.
Os especialistas chamam atenção para a tendência revelada pelos números das prefeituras: eles
mostram que a quase totalidade
do processo de urbanização nas
grandes cidades ocorre por meio
de moradias precárias e das ocupações ilegais do solo.
"No fundo, a urbanização tem
acontecido quase que exclusivamente de forma ilegal, seja pelo
crescimento das favelas ou dos loteamentos irregulares", disse Suzana Pasternak, professora da
FAU (Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo), da USP.
"Grande parte do aumento dos
domicílios próprios ocorreu nas
áreas urbanas informais, especialmente favelas, condomínios e loteamentos clandestinos", afirmou
Diana Meirelles da Motta, pesquisadora do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
A migração é uma das causas da
concentração de favelas nas
maiores cidades, segundo o IBGE,
embora o fenômeno tenha diminuído nos últimos anos. Para Dulce Pandolfi, da FGV (Fundação
Getúlio Vargas), a migração provocou o "boom" das favelas no
passado. Mas agora o que mais
impulsiona é a redução do rendimento da população.
Urbanizá-las ou criar conjuntos
habitacionais para transferir os
moradores muitas vezes não resolve o problema, disse Pandolfi.
"É que ele [o morador de favela]
vai ter de pagar imposto, água,
luz, que não pagava antes. A renda não acompanha as melhores
condições de habitação."
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