São Paulo, quarta-feira, 14 de março de 2001

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INFÂNCIA

O Nordeste, onde há mais catadores infantis, teve o melhor resultado; meta é extinguir trabalho infantil no lixo em 2002

Projetos tiram 13 mil crianças de lixões

Moacyr Lopes Júnior/Folha Imagem
Tamires da Silva, que trabalhava no lixão de Carapicuíba e hoje participa do projeto Fundação Orsa


WILSON SILVEIRA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) anunciou ontem o resultado de uma pesquisa que indica a retirada de 13.230 crianças de lixões de 194 cidades brasileiras desde junho de 99, quando foi lançada a campanha "Criança no Lixo Nunca Mais", apoiada pelo órgão.
Ao todo, segundo levantamento que levou à criação da campanha, existiam naquela época 43.320 crianças trabalhando em lixões de 3.800 cidades brasileiras. A meta é extinguir o trabalho infantil no lixo até o final do ano que vem.
A região de onde foram retiradas mais crianças de lixões foi a Nordeste -5.566 em 68 cidades. Os melhores resultados foram registrados em Natal (RN), com 510 crianças fora do lixo, Aracaju (SE), com 509, Curitiba (PR), com 488, Campo Grande (MS), que tirou 400, e Olinda (PE), onde 392 saíram dos lixões.
No Estado de São Paulo, a pesquisa aponta que 558 crianças abandonaram o trabalho com lixo em 17 cidades.
Trabalhando nos lixões, as crianças e jovens acabam deixando de estudar. Ficam ainda expostos a uma série de perigos, desde cortes e ferimentos até doenças transmitidas por animais e pela ingestão de alimentos estragados.
Os lixões são também associados à marginalidade, por serem, em geral, isolados e mal vigiados. "É comum haver problemas com prostituição infantil e o envolvimento de menores com tráfico e consumo de drogas", diz Teia Magalhães, secretária-executiva do Fórum Nacional Lixo e Cidadania, idealizador da campanha.
A maior parte dos recursos da campanha vem do governo federal -R$ 51 milhões no ano passado, destinados a 156 municípios, mais os programas de Bolsa-Escola. A maioria dos recursos federais foi destinada à construção e recuperação de aterros sanitários.
"Para atingirmos nossa meta em 2002, teremos de transformar todos os lixões em aterros, para evitar que as crianças voltem ao trabalho no lixo", afirma Teia.
O Fórum Nacional Lixo e Cidadania, composto por 44 entidades governamentais e não-governamentais, apóia e dá suporte técnico a propostas idealizadas pela sociedade organizada e pelo poder público nas cidades.
Os programas em aplicação atualmente no país têm uma linha mestra comum: levar as crianças que trabalhavam nos lixões para a escola e oferecer a elas atividades complementares no turno em que estariam livres.
As famílias, de uma forma geral, recebem inicialmente uma bolsa para manter os filhos fora do lixão. Outra iniciativa comum é a formação de cooperativas de catadores, que possam organizar a comercialização dos produtos recicláveis de forma mais lucrativa.

Exemplo
Participou da rápida cerimônia no Unicef a presidente da Associação dos Catadores de Papel, Papelão e Material Reciclável de Belo Horizonte, Maria das Graças Marçal, a "dona" Geralda.
Geralda, 50, disse que criou nove filhos catando papel nas ruas de Belo Horizonte. Há 13 anos ajudou a fundar a associação, que reúne hoje 319 famílias e paga de dois a três salários mínimos por mês para cada catador.
A representante do Unicef no Brasil, Reiko Niimi, disse que percebe no governo brasileiro o empenho em eliminar as piores formas de trabalho infantil.
Os resultados da campanha Criança no Lixo Nunca Mais foram festejados pelo Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) e pelo Fórum Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Representantes das entidades afirmam, porém, que os projetos não devem ser pontuais.
Para Charles Roberto Pranke, coordenador do Fórum, é preciso articular as ações da campanha a políticas públicas que garantam educação, atendimento de saúde, trabalho e renda para as famílias de catadores, de modo a impedir que as crianças voltem a trabalhar nos lixões por necessidade.
Cláudio Augusto Vieira da Silva, presidente do Conanda, concorda. "Se isso não acontece, por mais que se consigam avanços importantes, eles ainda serão pontuais", afirma.
Ao anunciar os primeiros resultados da campanha, Reiko Niimi, e o ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, lançaram o manual "Do Lixo à Cidadania - Estratégias para a Ação".

Colaborou Mariana Viveiros, da Reportagem Local


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