São Paulo, Domingo, 14 de Março de 1999
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INVESTIMENTO
Opção por investir apenas na construção de usinas cria problema estrutural na rede de distribuição
Falta de verba deixa sistema
elétrico vulnerável

FERNANDO GODINHO
da Sucursal de Brasília


A transmissão de energia elétrica no Brasil está enfrentando um problema estrutural, provocado pela falta de investimentos e pela histórica preferência estatal por megalomaníacos projetos de geração de energia.
A despeito dos problemas que podem ser provocados por fenômenos naturais -como o raio que atingiu a subestação de Bauru (SP) na última quinta-feira e gerou um blecaute em dez Estados e no Distrito Federal- , a transmissão de energia no Brasil causa preocupação nas autoridades públicas e privadas ligadas ao setor.
"Vivemos um equilíbrio instável", disse à Folha o ministro Rodolpho Tourinho (Minas e Energia), na noite de sexta-feira.
"O sistema seria mais confiável se fossem feitos mais investimentos em transmissão", reconhece o diretor-geral da entidade privada ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), Mário Santos, responsável pela gestão do setor elétrico no Brasil.
Os números de investimento reforçam a preocupação do governo e do ONS. A Eletrobrás, holding estatal do setor elétrico, deveria ter investido R$ 3,6 bilhões no ano passado (em transmissão, geração e distribuição).
Mas a política de contenção de gastos determinada pela equipe econômica permitiu que a estatal investisse R$ 2,8 bilhões em 1998 (uma redução de 22% em relação à previsão inicial).
Até 2001, o Ministério das Minas e Energia estima que serão necessários R$ 30 bilhões em investimentos para garantir uma maior tranquilidade no setor elétrico.
O ministro Rodolpho Tourinho admite que a União não tem essa capacidade de investimento. "Não temos esse dinheiro", afirma o ministro. De acordo com os planos da Eletrobrás, os investimentos específicos na área de transmissão estão estimados em R$ 6,1 bilhões -ou um quinto da situação ideal imaginada pelo Ministério das Minas e Energia.

Megalomania
Mário Santos, do ONS, lembra que o governo sempre preferiu investir em chamativos projetos de geração de energia, o que fez o Brasil ter hoje as usinas hidrelétricas de Itaipu (a maior capacidade de produção do mundo) e Serra da Mesa (cujo lago possui o maior volume de água de todo o mundo).
"A transmissão nunca foi priorizada porque o governo entendia que essa atividade não era rentável, mas uma decorrência das unidades de geração", avalia Santos, que antes de dirigir o ONS era vice-presidente da Eletrobrás.
Para ele, esse entendimento do governo irá mudar com a privatização da estatal, que está sendo desmembrada em unidades geradoras e transmissoras -apenas as geradoras serão vendidas em um primeiro momento.
"Com a cisão da Eletrobrás, o governo está vendo que a transmissão é uma atividade rentável como as demais, pois as novas empresas que estão sendo criadas demonstram que é possível obter uma boa receita com a transmissão de energia", diz o diretor do ONS.
A inevitável carência de recursos por parte da União está reforçando a idéia de privatizar a malha de transmissão, o que não está previsto no modelo de desestatização do setor elétrico inicialmente desenhado pelo governo.
O ministro Rodolpho Tourinho é um entusiasta dessa idéia. "O sistema de transmissão deve ser privatizado, pois o governo não tem dinheiro para investir no serviço e não vai ter condições de bancar as expansões necessárias", afirmou.


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