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EDUCAÇÃO
Crise no mercado privado ocorre, segundo as instituições, devido a uma oferta de vagas superior à demanda
Sem alunos, 25% das escolas podem quebrar
AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
O crescimento vertiginoso do
número de instituições privadas
de pré-escola e educação fundamental e média em São Paulo nos
últimos seis anos acabou por se
tornar o maior vilão desse mercado. A oferta de vagas não encontrou resposta na demanda. Em razão disso, cerca de 1.500 (25%)
das 6.000 escolas pagas do Estado
podem fechar as portas até o final
de 2003, segundo o próprio sindicato do setor (Sieesp) e consultores da área ouvidos pela Folha.
Outras tantas, segundo o Sieesp,
não devem resistir a três ou quatro anos, a menos que se fundam.
Dados do Ministério da Educação confirmam o quadro. No ensino médio, por exemplo, o número de escolas ou cursos novos
(ciclos) em São Paulo aumentou
em 93% entre 1996 e 2001, enquanto o número de matrículas
caiu 14,7%. No ensino fundamental, as taxas cresceram 93,0% e
0,3%, respectivamente. Na pré-escola, 126,5% e 50%. Em seis
anos, escolas paulistas do ensino
médio perderam 47 mil alunos.
600 mil sem escola
No Estado todo, entre 70% e
80% das escolas estariam "trabalhando no prejuízo", segundo o
Sieesp. Muitas delas estariam
prestes a fechar suas portas porque não há dinheiro para quitar
os impostos e acertar salários com
professores e funcionários.
Nas escolas particulares paulistas de pré-escola, ensino fundamental e médio, estudam cerca de
1,26 milhão de alunos e lecionam
60 mil professores. Metade deles
pode ter de mudar de escola ou ficar sem emprego.
O sinal de alerta -acionado
neste mês com a fusão de escolas
tradicionais em São Paulo- ainda não foi ouvido pelas autoridades educacionais. Embora a educação seja uma obrigação constitucional do Estado, MEC e Secretaria da Educação de São Paulo
informaram que a crise das escolas privadas é problema de seus
mantenedores. A função dos governos federal e estadual seria zelar pelas vagas no ensino público.
Nos anos 70, foi o Estado que incentivou a abertura das escolas
privadas, lembra o presidente do
Sindicato dos Professores de São
Paulo, Luiz Antonio Barbagli, 51.
"Agora, espera-se que o governo
tenha uma atuação."
A taxa de inadimplência nas escolas pagas (cujas mensalidades
vão de R$ 300 a R$ 400, no interior
paulista, e de R$ 650 a R$ 1.000, na
capital), em decorrência da queda
de rendimento médio do trabalhador brasileiro (10.6% desde
1999, segundo o IBGE), não é um
fator primordial para a crise do
setor, como poderia se esperar.
A partir dessa constatação, João
Paulo dos Santos Nogueira, 48, o
diretor do Ipso Dados, um instituto de pesquisa que presta assessoria na área de educação, conclui
que a queda nas matrículas não se
deve a uma migração para a escola pública. "Deve-se a uma queda
na natalidade da classe média."
Ele cita o bairro classe média de
Santo Amaro, zona sul, e os dados
do IBGE, para ilustrar essa queda.
Na região, o Censo 2000 contou
5.670 jovens de 15 a 19 anos e apenas 2.503 crianças de 0 a 4 anos.
"Num período de 15 anos, houve
uma queda de 56%", diz. Enquanto em 1985/87 havia 5.670 crianças entrando na pré-escola, agora
só existem 2.503 candidatas.
Pelo IBGE, mães com oito ou
mais anos de estudos têm hoje
uma média de 1,6 filho. Mulheres
com quatro anos ou menos de escolaridade têm 3,1 filhos, média
que prevalece nas periferias e regiões mais pobres do Estado.
"O problema das escolas privadas é que onde tem dinheiro não
tem criança, e onde tem criança
não tem dinheiro", diz Nogueira.
Enquanto a demanda de matrículas caía, a oferta de vagas subia,
levando a uma sobra de carteiras
na classe. "Quando a escola chega
a 30% de ociosidade, ela entra no
amarelo, já não consegue investir.
Se chega a 50%, está no vermelho,
no prejuízo", diz Eugênio Cordaro, da Corus Consultores. Segundo suas projeções, apenas 20%
das escolas privadas estão com
menos de 20% de ociosidade, em
"condições razoáveis de rentabilidade, que permitem investimentos". E apenas 10% estariam numa "situação boa". "Para que o
mercado se estabilizasse, 25% das
escolas -ou 1.500 no Estado-
precisariam fechar ou se fundir."
A direção do Sieesp diz que vem
detectando a crise há alguns anos.
"Muitas escolas ainda não fecharam porque não conseguem acertar suas contas", diz José Augusto
Lourenço, presidente do sindicato. Na sua avaliação, um fechamento em grande número, com
desemprego de professores e prejuízos aos alunos só não ocorrerá
se o governo participar desse processo. "Ainda há tempo, mas dependemos do trabalho sério também da parte do governo."
Federação, sindicato e donos de
escola defendem uma redução
dos impostos como forma de reduzir a crise. Seria, na opinião deles, uma solução mais justa.
A fusão de instituições, outro
caminho apontado para evitar a
falência, é um processo demorado nem sempre possível. A unificação, por exemplo, das escolas
Logos, Mater Dei e Bem Me Quer,
na zona sul de São Paulo, consumiu um ano e meio. Os acertos
ainda estão sendo feitos.
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