|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Abordagem da Aids em novela é criticada
Para Ministério da Saúde, médicos e ONGs , "Páginas da Vida", da Globo, mostrou tratamento antiético
LAURA MATTOS
FABIANE LEITE
DA REPORTAGEM LOCAL
A maneira como "Páginas da
Vida", novela das oito da Globo,
iniciou a abordagem sobre a
Aids nesta semana gerou duras
críticas do Ministério da Saúde,
da Sociedade Brasileira de Infectologia e de ONGs que defendem portadores do HIV.
O personagem soropositivo
entrou na história no capítulo
da última segunda-feira. O
principal problema apontado
pelas entidades é o fato de o
médico Diogo (Marcos Paulo)
ter dado a ele o diagnóstico sem
antes realizar o teste do HIV,
com base apenas na aparência
do paciente -magro, abatido e
com manchas na pele- e num
exame clínico superficial.
Na trama, o infectologista é
reconhecido por ter tratado de
soropositivos na África.
No episódio seguinte, o paciente diz a Diogo que está com
gripe. O médico o contesta:
"Você está com Aids e sabe que
está. Se quiser levantar e sair do
hospital, pode ir, mas pela minha experiência eu posso garantir que você vai morrer".
Manoel Carlos, autor de "Páginas", teve um filho que morreu vítima de Aids, aos 33 anos,
em 1988. Procurado ontem pela Folha, disse que a resposta
seria dada pela emissora. A
Central Globo de Comunicação
afirmou achar "estranha a reação precipitada" quando a
emissora "resolve tratar de um
problema que estava meio escondido do noticiário".
Ontem, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) divulgou uma nota de repúdio à novela. Para os médicos infectologistas, a "abordagem foi totalmente inadequada e antiética".
"A SBI entende que uma emissora com a responsabilidade
social da TV Globo deva estar
melhor assessorada quando
veicular assuntos médicos em
sua programação", diz a nota.
Juvêncio Furtado, diretor da
SBI, ressalta o fato de uma enfermeira (Letícia Sabatella) ter
diagnosticado a doença após
um breve encontro com o paciente no corredor. "Depois, ela
sai correndo para avisar ao médico, e ele fica tão assustado
quanto ela, como se eles estivessem diante de uma bomba."
Ele defende que nenhum
médico pode dar um diagnóstico como esse sem antes conhecer o resultado do teste do HIV.
"Lutamos há 25 anos para desmitificar a doença, e a novela
acabou estimulando o preconceito. A nossa esperança é que
o autor se toque dessa besteira
e a corrija. Estamos preocupados com a repercussão dessa
abordagem", afirmou. Segundo
Furtado, são 600 mil os infectados por HIV no Brasil.
O Ministério da Saúde informou que espera que a novela
mostre um contraponto à atitude antiética do médico da
trama. "A novela pode até estar
retratando uma situação que
acontece em algum serviço,
mas não se faz diagnóstico
olhando o paciente e [o personagem] também feriu regras da
conduta médico-paciente",
afirma Mariângela Simão, diretora do programa de Aids da
pasta. Ela destacou que o teste
de Aids no país não é compulsório -na novela, o médico
Diogo decide fazer o teste apesar da resistência do paciente.
Ainda segundo a diretora, a
imagem de um paciente abatido como a do personagem retoma as utilizadas em campanhas no início da epidemia, nos
anos 80. Depois verificou-se
que as campanhas mais assustavam do que educavam.
"Páginas da Vida" registra a
maior média de audiência de
novelas dos últimos dez anos.
Das TVs ligadas no horário,
68% sintonizam a trama.
Texto Anterior: Circuncisão dobra proteção contra HIV Próximo Texto: Iniciativa será reconhecida, afirma a Globo Índice
|