São Paulo, quinta-feira, 15 de fevereiro de 2001

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JUSTIÇA

Juliano Sabino e José Pereira da Silva pegam pena de 21 anos de prisão em regime fechado por morte de adestrador de cães

Skinheads são condenados por morte de gay

Carla Romero - 8.fev.2001/Folha Imagem
José Nilson Pereira da Silva (esq.) e Juliano Sabino dois dias após a morte do adestrador de cães


ALENCAR IZIDORO
DA REPORTAGEM LOCAL

Dois skinheads foram condenados a 21 anos de prisão em regime fechado pela morte do adestrador de cães Edson Neris da Silva, 35, e por formação de quadrilha.
A sentença contra Juliano Filipini Sabino, 29, e José Nilson Pereira da Silva, 28, saiu na madrugada de ontem, após mais de 11 horas de julgamento no 1º Tribunal do Júri do Fórum Criminal da Barra Funda, na zona noroeste de São Paulo. A defesa vai recorrer.
Eles integram um grupo de 18 skinheads (cabeças raspadas) presos após o assassinato de Neris da Silva, na praça da República (região central), no dia 6 de fevereiro do ano passado. Os outros 16 ainda serão julgados.
O adestrador foi espancado até morrer porque estava de mãos dadas com Dário Pereira Netto, 34, que conseguiu escapar. Eles eram homossexuais.
Segundo Marcelo Milani, promotor responsável pela acusação, essa condenação foi a primeira no Brasil por intolerância sexual. Ela também é inédita por envolver uma quadrilha de skinheads. "É um momento para mudar as páginas da história do país", disse.
Dos 7 integrantes do júri popular (2 homens e 5 mulheres), 6 votaram pela condenação por homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, meio cruel e impossibilidade de defesa da vítima), estabelecendo pena de 19 anos de reclusão.
O crime de formação de quadrilha (eles pertencem aos Carecas do ABC, conhecidos por pregar idéias nacionalistas contra minorias) foi definido por 5 jurados, acrescentando mais dois anos de prisão aos dois skinheads.
Eles foram absolvidos pelo júri, por 4 votos a 3, na acusação de tentativa de homicídio contra Pereira Netto, que teria levado um chute nas costas e um tapa no rosto antes de sair correndo.
No julgamento, os acusados mantiveram a posição adotada desde a prisão, negando participação no crime. Eles voltaram a dizer que não conheciam os outros 16 presos e admitiram apenas ter pertencido aos Carecas do ABC cinco anos atrás.
"Eles não são mais esses monstros", disse a advogada Neide da Silva Viera, durante a defesa.
Na sentença, o juiz Luís Fernando Camargo de Barros Vidal afirmou que o crime foi "um grande golpe de traição à idéia de democracia", já que os réus renunciaram ao debate político para agir "de forma criminosa, em prejuízo da vida humana".
"A intolerância como princípio de ação é absolutamente censurável e com ela de igual modo o direito penal há de se revelar inflexível", diz a sentença.
Segundo Barros Vidal, "dois homossexuais têm o direito de andar de mãos dadas nas ruas tanto quanto dois carecas com suas cabeças raspadas, roupas e bijuterias exóticas".
O juiz também fez referências a um estudante brasileiro que conseguiu asilo político nos Estados Unidos, em outubro passado, alegando ter sofrido discriminação sexual no Brasil. "(É) uma triste ironia para quem, como os réus, invoca o patriotismo."
A promotoria se disse satisfeita com a condenação dos skinheads. "Ficou dentro do que a gente estava esperando. É alta para o padrão brasileiro", disse Milani, que não pretende recorrer da sentença que absolveu Sabino e Pereira da Silva em uma das três acusações.
Se a condenação por homicídio fosse maior que 20 anos, outro júri teria que ser realizado.


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