São Paulo, sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

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44% iniciam tarde o tratamento para Aids

Especialistas afirmam que quanto mais cedo a doença é diagnosticada, melhor é a qualidade de vida do paciente depois

Para a coordenadora do programa, atraso é fruto de diagnóstico tardio devido ao medo do paciente e acesso difícil à realização de exame

ANGELA PINHO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O tratamento para Aids começou tarde para 50.393 brasileiros entre 2003 e 2006. O número representa 43,7% das 115.441 pessoas que iniciaram terapias para enfrentar a doença nesse período.
Especialistas afirmam que, quanto mais cedo a Aids é diagnosticada, melhor é a qualidade de vida do paciente depois. Tanto que, dos que contraíram a doença e iniciaram tratamento tardio, 28,7%, ou 14.462, morreram no início da terapia.
Esses dados integram o relatório "Resposta Brasileira à Epidemia de Aids 2005-2007", do governo federal.
De acordo com o último boletim epidemiológico do ministério, o Brasil tem uma tendência de queda da incidência de Aids. Foram 32.628 casos, em 2006, contra 38.816, em 2002.
A situação do tratamento tardio é mais grave entre homens e pessoas mais velhas. Segundo o relatório, na faixa etária entre 15 e 19 anos, a maioria (83,8%) iniciou o tratamento no momento adequado. Já entre os que têm mais de 60 anos, a probabilidade é sete vezes maior de o paciente procurar tarde o sistema de saúde.
Também segundo os dados do relatório, cerca de 50% dos homens com a doença procuram o tratamento tarde. Entre as mulheres, o índice é de 36%.
De acordo com o documento, o principal motivo para a diferença é que o teste de HIV faz parte dos exames pré-natais.
O dado é corroborado pelo pesquisador Alexandre Grangeiro. Ele estima que só 8% das pessoas fazem teste anti-HIV de forma "espontânea"; o restante o faz por associação a outro "evento de saúde" -além dos pré-natais, doação de sangue e exames médicos.
Os dados variam entre as regiões, reforçando a hipótese de que o problema é relacionado à dificuldade de acesso ao diagnóstico. O tratamento tardio é maior no Norte (53%) e no Centro-Oeste (47%).
Para o Programa Nacional de DST e Aids, o tratamento tardio é fruto do diagnóstico também demorado, tanto pelo estigma da doença e pelo medo do paciente como pela dificuldade de acesso aos exames e pela demora do resultado dos testes.
Pesquisa encomendada pelo Ministério da Saúde mostra que 30% dos centros que fazem diagnóstico, tratamento e prevenção da infecção do HIV possuem falhas que culminam na desistência do paciente em pegar o resultado do exame ou no abandono do tratamento.
O sanitarista Mário Scheffer, do Grupo Pela Vidda/SP, cita, entre as falhas do sistema, a falta de campanhas que estimulem a realização do exame e a demora na entrega do resultado (cerca de 15 dias) como os fatores que colaboram para o diagnóstico tardio.
"Não adianta termos um tratamento de primeiro mundo se as pessoas não conseguem chegar ao serviço a tempo de se beneficiarem da terapia", diz ele.
Dizendo ser "muito preocupante" o número de tratamentos que começam após o ideal, a coordenadora do Programa de DST e Aids, Mariângela Simões, disse que uma das prioridades é aumentar o número de testes rápidos nos centros de saúde, que podem diagnosticar a doença em até meia hora.
"A pessoa tem que se dispor a fazer o teste, mas o sistema tem que facilitar o acesso. Ele dificulta quando faz a pessoa ir uma vez para aplicar o teste e outra para pegar o resultado."
No relatório, o número de diagnósticos tardios foi medido com base no primeiro exame de contagem de linfócitos T-CD4 (células de defesa do sistema imunológico que são infectadas pelo vírus HIV). Foi considerado diagnóstico tardio o resultado de pacientes com marca menor que 200 células/mm3 de T-CD4 (geralmente quando o portador contraiu o vírus há pelo menos cinco anos) e com óbito no início do tratamento.
De 2004 para 2006, o número de aposentadorias pela doença caiu 28%. Segundo Grangeiro, a queda é reflexo da evolução do tratamento, o que fez com que pessoas com o vírus deixassem de se aposentar.


Colaborou CLÁUDIA COLLUCCI, da Reportagem Local

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