São Paulo, domingo, 15 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O FIM DO CARANDIRU

As novas unidades construídas no Estado, criadas para esvaziar os DPs, não conseguem atender a demanda

Sem Detenção, déficit de vagas aumenta

DA REPORTAGEM LOCAL

A desativação da Casa de Detenção aumentou a superlotação nos presídios de São Paulo, principalmente nos Centros de Detenção Provisória -as prisões-modelo criadas para desafogar as carceragens de distritos policiais.
Dos 15 CDPs construídos até agora no Estado, 11 estão com número de presos superior à capacidade projetada -768 vagas. A média é 42,6% acima, mas há unidades com 83% a mais de detentos, como Santo André (região do ABC) e Sorocaba, no interior.
Esse tipo de prisão abriga criminosos não-condenados, que ainda não podem ser transferidos para penitenciárias estaduais.
Nos presídios comuns, de regime fechado, a média de superlotação é 42,1%. A Penitenciária de Araraquara (273 km de São Paulo) está entre as mais críticas, com 927 detentos, apesar da capacidade para abrigar 500 -diferença de 85,4%, segundo dados da própria Secretaria da Administração Penitenciária.
Hoje, São Paulo tem um déficit total de 27,5 mil vagas no sistema prisional -o maior do país. De cada quatro presos, um não tem espaço construído para permanecer detido. ""Não basta fechar um presídio em más condições e ficar com os braços cruzados. A continuidade é imprescindível", afirma o secretário da Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa.
Até março do ano que vem, a secretaria deve concluir a construção de mais nove presídios, criando 5.330 vagas. Segundo Furukawa, há outros projetos em estudo, para pedido de verbas federais do Fundo Penitenciário Nacional.
O secretário questiona a média de superlotação apresentada pela Folha, calculada apenas entre os presídios de regime fechado masculinos. Ao avaliar todas as unidades juntas, incluindo as do semi-aberto e prisões femininas, diz ele, a média cai pela metade, para 20%. Nos CDPs, porém, ele afirma que o excedente está perto de 40%, como o calculado.
Todas as novas prisões serão construídas para no máximo 768 detentos. ""É mais fácil ter controle sobre unidades pequenas."
De acordo com o sociólogo Sergio Adorno, coordenador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, o ideal é ter prisões para no máximo 600 pessoas, conforme recomenda a ONU (Organização das Nações Unidas).
Para Adorno, unidades grandes favorecem a corrupção. ""Você tem um sistema desagregador, que gera violência de vários lados, do funcionário com o preso, do preso com o funcionário. Isso cria uma idéia de que o detento tem de ser violento para se salvar e contribui para a violência", afirma.
Especialistas ouvidos pela Folha acreditam que a desativação da Detenção era necessária para mostrar que o sistema prisional passa por mudanças.

Expectativa
Na última terça-feira, a reportagem visitou a Casa de Detenção e conversou com presos. Quatro deles disseram ter ""esperança" de cumprir a pena mais rápido e conseguir benefícios de progressão -passar para o semi-aberto, onde podem trabalhar fora e apenas dormir na unidade.
"Aqui [na Detenção" você não pode trabalhar para ganhar uns dias", afirma o preso B., 25 anos, condenado a sete por roubo. Segundo a lei, o condenado pode abater um dia da pena para cada três trabalhados na prisão.
A expectativa de sair mais rapidamente dali e as lembranças dos dois filhos pequenos foram os únicos comentários positivos do preso, durante uma conversa de quase uma hora. Na cadeia, segundo B., o preso gasta o tempo fazendo exercícios, pensando em vingança -contra inimigos ou quem o prendeu- e reclamando da distância dos familiares.
"Na Detenção, o preso cumpre a pena de ponta-a-ponta. Em uma unidade menor é melhor para quem tem pouca pena e é primário", diz o detento P.S.S., 30, condenado por tráfico de drogas.


Texto Anterior: Desativação atrasou quase 20 anos
Próximo Texto: Vizinhos vibram com a desativação
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.