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LEGISLAÇÃO
Participação de menor na morte de estudantes reacendeu discussão sobre lei; Zilda Arns defende a realização de plebiscito
Crime reabre debate sobre maioridade penal
DA REPORTAGEM LOCAL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O assassinato dos namorados
Liana Friedenbach, 16, e Felipe
Silva Caffé, 19, em Embu-Guaçu
(Grande SP), num crime liderado
por um menor de 16 anos, segundo a versão da polícia, reacendeu
a discussão no país sobre a redução da maioridade penal.
Alguns setores ligados à Igreja
Católica e ao Judiciário se manifestaram favoráveis ao início do
debate. O pai da estudante morta,
Ari Friedenbach, disse estar disposto a liderar uma campanha
pela punição do infrator independentemente da idade dele.
"Não sou a favor da redução da
maioridade para 16 anos. Estão
colocando o número 16 como se
ele tivesse alguma razão de ser,
sendo que na Febem há homicidas com 15, 14 e até 12 anos. Defendo que quem cometeu um crime tem que cumprir pena, em
qualquer idade", disse o pai.
Um dia depois de dom Aloísio
Lorscheider, cardeal-arcebispo de
Aparecida (interior de SP), se dizer favorável à redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, a
coordenadora da Pastoral da
Criança, Zilda Arns Neumann, irmã do cardeal dom Paulo Evaristo Arns, defendeu a realização de
um plebiscito sobre esse tema,
precedido de um "amplo debate".
"O dom Aloísio Lorscheider levantou um assunto da maior importância porque a criminalidade
no país está aumentando a cada
dia e há um abuso dos velhos criminosos em cima dos adolescentes", afirmou ela à Folha.
"Como não há políticas públicas que possam dar a esses jovens
oportunidades de vida, eles são
presas fáceis", disse Zilda Arns,
ressalvando não ter ainda uma
opinião definida sobre a questão.
Indicada ao Nobel da Paz em
2001 e 2002, ela defende uma discussão nacional no primeiro semestre de 2004, que deixaria a população preparada para o plebiscito. Ela acredita que esse debate
serviria "para que houvesse uma
conscientização de que não há como deter a violência sem ações
preventivas."
Representante da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil), Márcia Accioli disse que a
entidade é "oficialmente contra a
redução da maioridade penal",
posição que foi divulgada em julho de 2001. O arcebispo metropolitano de São Paulo, dom Cláudio Hummes, afirmou se opor a
uma decisão apressada e que a
pressão por medidas enérgicas
para melhorar a segurança pública é grande, mas, ainda assim,
"não se deve reagir em cima de
emoções imediatas".
O presidente do TST (Tribunal
Superior do Trabalho), ministro
Francisco Fausto, defendeu a redução da maioridade penal para
16 anos sob a alegação de que um
jovem com essa idade já tem
consciência do que está fazendo.
Ele diz que a quantidade de crimes bárbaros cometidos por menores está aumentando e que algo
precisa ser feito rapidamente.
Já o presidente do STJ (Superior
Tribunal de Justiça), Nilson Naves, defendeu a manutenção da lei
e disse que "a criminalidade há de
ser combatida com a utilização de
outros meios". O ministro do STF
(Supremo Tribunal Federal) Nelson Jobim considera que a redução da maioridade penal teria como consequência a superlotação
das cadeias.
O ministro Márcio Thomaz
Bastos (Justiça) já havia criticado
anteontem a idéia de mudança na
idade penal. O secretário especial
de Direitos Humanos, Nilmário
Miranda, reforçou ontem essa posição, após se reunir com representantes de ONGs, da CNBB e
parlamentares. Para ele, um jovem de 16 anos está "em formação" e, portanto, "não tem plena
capacidade sobre seus atos".
Na Câmara dos Deputados, há
15 projetos propondo a redução
da maioridade penal de 18 para 16
anos. Eles estão na Comissão de
Constituição e Justiça, alguns há
dez anos, aguardando serem colocados na pauta de votação.
José Fernando da Silva, vice-presidente do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente), alega
que "é preciso acreditar na ressocialização". "O problema está na
aplicação do ECA [Estatuto da
Criança e do Adolescente], que
não é feita de forma correta", diz,
citando que só 10% dos delitos são
praticados por menores de 18.
O presidente da seccional paulista da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Carlos Miguel
Aidar, diz que as experiências de
redução da maioridade realizadas
no mundo inteiro se mostraram
frustrantes, não tendo havido redução da criminalidade.
O governador Geraldo Alckmin
(PSDB) é contra a mudança da
idade penal, mas pediu a um grupo de secretários que elaborem
sugestões a serem incorporadas
ao ECA, visando ampliar os prazos de internação para menores
que cometam delitos graves
-restritos hoje a três anos ou até
que completem 21 anos.
"O ECA é injusto", afirma Jorge
Damus, pai de um estudante
morto em 1999 e que, há quatro
anos, coordena a campanha "Crime não tem idade: maioridade
penal aos 14 anos". Ele diz que as
estatísticas da Febem mostram
que 92% dos crimes de latrocínio
e homicídio são feitos por menores de 14 a 18 anos.
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