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ANÁLISE
Reforma deve articular e conectar diferentes órgãos
CLÁUDIO BEATO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Reformas no âmbito da Justiça e nas polícias são eventos
raros. Via de regra ocorrem no
esteio de agudas crises institucionais, por meio de lentos e
graduais processos de reestruturação dos sistemas de Justiça
criminal.
Na Colômbia, mudanças legislativas profundas precederam a reforma da polícia, visando controlar a corrupção sistêmica que assolava a organização. Lá existem leis que podem
afastar qualquer policial de sua
função sem nenhuma evidência que não a suspeita de seus
superiores. Em Nova York, o
exaltado profissionalismo de
sua polícia foi precedido de longo processo de reformas iniciado em administrações anteriores e implementados de forma
continuada. Hong Kong empreendeu uma ampla mudança
de uma das polícias asiáticas
mais corruptas para um dos
modelos mais modernos de policiamento comunitário.
Da mesma maneira, as polícias irlandesas tiveram que
despir-se de seu modelo militarista de lidar com o terrorismo
para uma aproximação crescente com as comunidades na
qual atuavam.
E no Brasil? Temos uma dificuldade estrutural relacionada
à inserção das polícias no interior de nosso sistema de Justiça
que, embora definido constitucionalmente, está longe de se
constituir num modelo racional de integração e compartilhamento de objetivos. Esta
disfuncionalidade não se restringe apenas às polícias, mas
se estende a Ministério Público, Poder Judiciário, sistema
prisional e a toda a infraestrutura legislativa que rege estas
organizações por meio do Código Penal e Processual.
Apenas recentemente os
EUA começaram a testemunhar algo parecido com uma integração do sistema de Justiça
criminal. Isso significa que há
uma certa complementaridade
nas ações das polícias, promotores e juízes. Por aqui ainda
estamos longe disso. Pelo contrário, o que temos são organizações em conflito e com visões
opostas acerca do problema
criminal, das soluções e metas a
serem perseguidas, a começar
das polícias Civil e Militar.
Mas promotores igualmente
não estão afinados com as polícias, e juízes ainda vivem em
boa medida isolados na redoma
do mundo das leis e dos processos. Informações, por exemplo,
são recursos estratégicos raramente compartilhados por estas instituições seja por pura
veleidade institucional ou até
mesmo por interesses inconfessáveis. O resultado são organizações atuando por meio de
lógicas autorreferidas e frouxamente articuladas entre si.
Daí que qualquer reforma
que venha a se fazer no Brasil
na busca de resultados para o
controle de nosso grave problema de segurança pública deve
começar por articular e conectar diferentes órgãos e setores
da Justiça, afim de que eles efetivamente funcionem de forma
complementar e integrado.
Desobstruir canais e melhorar a comunicação pode ser um
bom começo na agenda da integração. Mas, sobretudo, necessitamos uma definição clara
dos problemas e de onde queremos chegar na segurança pública. Sabemos qual a matéria pública com a qual o sistema de
Justiça lida: policiais, promotores, processos judiciais, prisões, crimes e criminosos, além
de orçamentos e recursos operacionais. Mas qual o serviço
público que se quer oferecer?
Quais os resultados que buscamos para a sociedade? Estas
respostas vão muito além de interesses corporativos e localizados, pois dizem respeito às
aspirações e interesses mais
amplos a sociedade.
CLAUDIO BEATO é coordenador do Centro de
Estudos em Criminalidade e Segurança Pública,
da UFMG, e está como professor visitante do
David Rockfeller Center of Latin American Sttudies da Universidade de Harvard
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