São Paulo, sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

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entrevista

Carro e bicicleta são inconciliáveis, afirma sociólogo

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

É moralista a ideia de que bastaria ao motorista ser mais educado e cortês para reduzir o número de mortes de ciclistas e motociclistas em São Paulo. A opinião é do sociólogo Eduardo Biavati, que dirigiu por 13 anos o programa de prevenção de acidentes da rede Sarah, famosa no tratamento de traumas.
O que falta, na opinião de Biavati, são estruturas viárias adequadas para a circulação de bicicletas e motos. "Não dá para misturar bicicleta e carro na mesma rua. O resultado são as mortes por esmagamento", afirma. A solução, segundo ele, é criar ciclovias e faixas para moto. Autor do livro "Rota de Colisão" em parceria com Heloisa Martins, Biavati diz na entrevista a seguir que é irresponsabilidade incentivar o uso de bicicleta em cidades como São Paulo.

 

FOLHA - Em 2003, morreram 22 ciclistas em São Paulo. Em 2007, foram 84 mortes. Por que aumentaram tanto essas mortes?
EDUARDO BIAVATI
- As cidades brasileiras não foram feitas para bicicletas e motos. Tudo foi pensado para carros.

FOLHA - O que é possível fazer para reduzir essas mortes?
BIAVATI
- Não dá para misturar bicicleta e carro na mesma rua. Quando ocorrem misturas díspares, de massas muito diferentes, você aumenta demais o risco para o mais frágil. É muito bonita essa ideia de bicicletas e carros na mesma via, mas isso é impossível em São Paulo.

FOLHA - Por quê?
BIAVATI
- Porque você não consegue oferecer o mesmo grau de segurança para todos. Não dá para colocar caminhão, carro, moto e bicicleta no mesmo saco. Tem de ter ciclovia e faixa para moto.

FOLHA - Especialistas criticaram a criação de faixa exclusiva para moto porque seria um incentivo para um veículo individualista e poluidor. Faz sentido essa crítica?
BIAVATI
- Não. Se nada for feito, em dois, três anos as mortes de motociclistas vão ultrapassar as de pedestres. Moto é um dos veículos que mais mata.

FOLHA - São Paulo tem 33,8 quilômetros de ciclovias. O que poderia ser feito para aumentar a segurança dos ciclistas?
BIAVATI
- A cidade precisaria construir mais 300 quilômetros de ciclovias, o que não vai ocorrer de uma hora para outra. A prefeitura poderia ter uma política de caminhos alternativos, pela qual os ciclistas usariam as vias menos congestionadas para evitar os choques com carros. É irresponsável incentivar o uso de bicicleta sem estrutura viária adequada e sem alertar os usuários para os riscos.

FOLHA - Há quem diga que não haveria tantas mortes se os motoristas fossem mais educados.
BIAVATI
- Essa visão é moralista. As pessoas morrem não por falta de educação, mas por causa da estrutura viária. Você pode ser gentilíssimo e, num piscar de olhos, atropelar um ciclista porque não o enxergou. Os pedestres morrem não porque são ignorantes. É porque não dá para andar nas calçadas. Se todo mundo fosse mais gentil, isso não mudaria muito. É preciso mudar a filosofia das ruas, separar carros de motos e bicicletas. Nessa redistribuição, acho que os carros devem perder espaço.


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