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"Meu ex-marido me chamava de seca", diz Odete
DA REPORTAGEM LOCAL
A engenheira Odete dos Santos,
46, relata as diversas situações de
preconceito que já sofreu por não
ter filhos e pelo fato de desejar tê-los sem estar casada. Leia, a seguir, o seu depoimento:
"Passei a vida sonhando em ter
filhos. Na minha cabeça, seriam
dez. Mas não foi assim. Estudei,
me formei, sempre trabalhando,
e, sem nunca ter me prevenido,
percebia que não engravidava.
Uni-me a um homem, e a idéia de
ter filhos ficou mais clara, mas o
bebê não vinha.
Houve a separação, e, aos 36
anos, nada de gravidez. Lembro
do meu ex-marido me chamando
de seca, aquilo doía como uma facada. Virava e mexia ele dizia: "Eu
não tenho culpa de você ser seca".
Nesse período, meus amigos se
casaram e tiveram filhos e quem
não tinha marido ou filhos não
mais era convidado para as festas,
como ocorria antigamente, pois
faltava o par ou os filhos.
O tempo passou, novos namorados surgiram e nada de gravidez. Ia ao médico e não tinha respostas. Quando nasceu um sobrinho, lembro da tristeza que senti
o dia em que eu estava levando-o
ao playground e fui barrada:
"Não..não...não vai descer com ele
não!". Quando tentava trocar sua
fralda, era repelida com frases do
tipo: "Não, você não sabe como
faz!". Ou: "Dar mamadeira? Imagine, vai sufocar meu filho!'
Descobri então que tinha miomas uterinos. Ouvia dos médicos
que era melhor operar. Um deles
chegou a dizer sem dó nem piedade: "Opere esse útero, tire isso fora, aproveite o feriado e vamos tirar isso, filhos você nunca vai ter
com esse útero!" Foi como uma
sentença de morte.
Passou o tempo, parei de ir a
médicos, mas queria fazer um
preventivo e fui em uma nova médica, e, para minha surpresa, ela
me disse: "Para melhorar esse útero, engravide".
Um mês depois, voltei grávida
ao consultório, mas perdi meu filho em um aborto espontâneo. E
aí começaram de forma mais violenta as manifestações de preconceito. A primeira foi da médica do
PS que me atendeu. Ouvi dela a
seguinte frase: "Mulheres na sua
idade têm fetos e filhos com problemas. Se for para abortar, vai
abortar mesmo, nada se pode fazer". Em julho de 2002, engravidei
novamente, e sofri nova perda.
Desde então, luto para ter um filho, fiz cinco FIVs [fertilização in
vitro] e uma inseminação.
É um sofrimento sem fim, uma
dor aguda que não ameniza jamais, é um ferida aberta no peito
para sempre.
Nas peregrinações em busca de
tratamento de baixo custo, deparei com vários preconceitos, como serviço público que não atende solteira. Antes, não atendia
porque eu tinha mais de 37 anos.
Fui chamada de desequilibrada
por buscar um filho estando solteira. O preconceito é escondido
atrás de conceitos de que toda
criança precisa de um pai."
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