|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ACIDENTE EM ALTO-MAR
O queimador de gás teria sido construído muito perto do deck; especialista diz que local era seguro
Funcionários apontam falhas na P-36
CRISTINA GRILLO
DA SUCURSAL DO RIO
A Aepet (Associação dos Engenheiros da Petrobras) afirma que
a plataforma P-36, que estava em
operação desde o dia 16 de maio
de 2000, tinha um erro fundamental em seu projeto.
De acordo com Argemiro Pertence, diretor de comunicação da
associação, o queimador de gás
natural, que, pelas normas de segurança, tem que ficar longe do
deck principal da plataforma, foi
instalado muito próximo ao local.
"Por causa do queimador, a
temperatura no deck chegava, às
vezes, a quase 80C, o que contraria todas as normas de segurança", disse Pertence, que é engenheiro de petróleo e trabalhou
durante 25 anos em áreas de prospecção da Petrobras.
As altas temperaturas, na avaliação do engenheiro, podem ter
alterado o funcionamento de
equipamentos sensíveis e prejudicado a detecção de irregularidades. Pertence diz que, se houve explosão, é porque havia vazamento
de gás. "Sem vazamento de gás,
não há explosão. Não houve vazamento de óleo, por exemplo, porque isso causaria um incêndio."
Segundo o engenheiro, empregados que estavam na P-36 informaram a representantes da Aepet
em Macaé que já haviam reclamado na quarta-feira de um vazamento de gás. "Eles disseram que
nada foi feito naquele momento,
para não paralisar a produção."
O presidente da Petrobras, Henri Philippe Reichstul, contestou
as denúncias da Aepet. Ele disse
que a empresa "jamais" colocaria
seus funcionários em risco, se já
tivesse detectado problemas.
A possibilidade de um vazamento de gás na plataforma foi
confirmada pelo engenheiro Tiago Lopes, da Coppe-UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da
Universidade Federal do Rio de
Janeiro), que estava na plataforma no momento da explosão.
Muito abalado, Lopes disse ao
diretor da Coppe, Segen Estefen,
que a primeira explosão, de menor impacto, deve ter aumentado
o vazamento de gás, levando a
uma grande explosão à 0h45.
"Ele disse que a plataforma toda
tremeu, o que mostra a força da
explosão", disse Estefen. A P-36
tem a altura de um prédio de 40
andares e pesa 60 mil toneladas.
Lopes, que até o final da tarde
ainda estava na plataforma P-47,
para onde foram levadas as pessoas que estavam na plataforma
acidentada, disse que a situação
da P-36 é bastante grave. "A avaliação dele é que a inclinação seja
de 30 graus, o que é muito para
uma plataforma", disse Estefen.
A P-36 foi construída em 1994
por encomenda da ENI (Ente Nazionale Idrocarburi, a estatal italiana de petróleo), para prospectar petróleo a uma profundidade
de até 500 metros. No final de
1996, a plataforma foi arrendada
pela Petrobras para ser utilizada
na bacia de Campos.
As obras de reconversão para
que a plataforma pudesse operar
em uma profundidade de até
1.360 metros foram feitas no Canadá. A P-36 chegou ao Brasil em
novembro de 1999 e começou a
operar em maio de 2000.
Alerta
A Comissão de Minas e Energia
da Câmara já havia sido alertada
sobre supostas irregularidades na
construção da P-36 e na contratação da empresa Marítima, responsável pela obra.
A denúncia foi apresentada pelo
PT em novembro de 1999. "Houve dispensa de licitação em uma
obra de US$ 500 milhões. Naquela
época denunciamos outros problemas, como grau de segurança e
viabilidade técnica da construção", disse o líder do partido na
Câmara, Walter Pinheiro (BA).
O líder do PDT, Miro Teixeira
(RJ), pediu ontem a convocação
do presidente da Petrobras para
explicar a explosão e o aumento
do número de acidentes.
O líder do governo na Câmara,
Arnaldo Madeira (PSDB-SP), disse que não será preciso convocar
o presidente da Petrobras. "Ele virá ao Congresso prestar esclarecimentos no momento oportuno."
Segurança
Embora os engenheiros da Aepet apontem falha na P-36, o especialista em segurança Moacyr
Duarte diz que ela é segura e tem
um plano de emergência eficaz.
Duarte, que é professor da Coppe-UFRJ, afirma que a morte de
um trabalhador no acidente de
ontem foi "uma fatalidade".
"Os que se feriram foram os que
estavam diretamente relacionados à emergência", diz Duarte.
"Só instalações militares são comparáveis a plataformas em termos
de segurança e treinamento de
pessoal. Até porque os trabalhadores não têm para onde ir em caso de acidente", completa.
Segundo o professor, a explosão
não foi exatamente uma surpresa
porque quanto mais novo ou
mais velho o equipamento, maior
a probabilidade de problemas.
Além disso, a Petrobras está pagando pelo seu "pioneirismo",
afirma. "Se você tem uma tecnologia de ponta, ninguém pode te
ensinar a usá-la. Você tem de
aprender fazendo", diz.
Para Duarte, uma prova da confiabilidade do esquema de segurança do local é o fato de que a extração de petróleo não estava sendo feita em sua plena capacidade.
"Caso isso estivesse acontecendo,
o acidente seria ainda pior."
Colaboraram a Sucursal de Brasília e a
Reportagem Local
Texto Anterior: Estado de funcionário é grave Próximo Texto: Em 3 anos, 81 mortos; terceirizados são maioria Índice
|