São Paulo, domingo, 16 de maio de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

INFÂNCIA

Tratamento de menino com dificuldades na fala propicia redefinição do relacionamento entre pais e filhos

Terapia ajuda a individualizar trigêmeos

Marlene Bergamo/Folha Imagem
Gustavo, cuja fala só era compreendida pelos irmãos; tratamento começou com uma análise da relação que os pais mantinham com os filhos


DA REPORTAGEM LOCAL

Aos dois anos, Gustavo apresenta dificuldades na fala. Expressa palavras desconexas que só são compreendidas pelos irmãos Maria Eduarda e João, que já falam corretamente. Eles são trigêmeos.
Preocupados, há dois meses, os pais -a educadora Regiane Ferrari Rego Barros, 39, e o representante farmacêutico Enrico Rego Barros, 29-, procuraram a fonoaudióloga Eloisa Tavares de Lacerda.
Para surpresa deles, a fono também era psicanalista, que, primeiro, quis conhecer o menino a partir dos pais. "A gente tinha vindo a umas cinco sessões e nada de ela [a terapeuta] chamar o Gustavo. Eu até comentei: "Rê, acho que o problema é com a gente'", conta Barros.
Um dos "problemas" estava na circulação de afeto na família. O nascimento dos trigêmeos havia transformado a casa em uma linha de produção. Os pais contavam até com uma planilha de Excel para organizar o dia-a-dia dos filhos. Hora da papinha, da vitamina, do banho, tudo era registrado para que não houvesse esquecimento e nem trocas.
Mãe de outros dois filhos adolescentes, do primeiro casamento, Regiane diz que teve dificuldades de individualizar a atenção às crianças. "Tinha três, mas, ao mesmo tempo, não me dedicava integralmente a nenhum. Olhava-os como um todo", conta.
O trabalho terapêutico começou com a construção de um canal de escuta para cada uma das crianças. Regiane e Barros dizem que passaram a enxergar a individualidade de cada um que, por questões de praticidade, estava sendo negligenciada.
"Às vezes, eu estava no sofá e um vinha e pedia água. Passavam dois minutos, vinha o segundo e também pedia água. Passavam mais dois minutos, o terceiro também queria água. Então, sempre quando um pedia, já dávamos para os três", conta Barros.
E assim era na hora da alimentação, do banho, da brincadeira e das broncas. "As pessoas só se referiam a eles como "os bebês", "os trigêmeos". E a gente, sem perceber, também estava fazendo isso, tratando-os no plural". Hoje, dizem estar mais atentos às peculiaridades de cada um.
Gustavo sempre teve uma ligação mais forte com a mãe. "Desde a barriga", diz Regiane. Na 30ª semana de gestação, ele parou de crescer. Em razão de uma deficiência placentária, os médicos decidiram antecipar o parto.
Gu, como é chamado, chegou a pesar menos de 1 kg, enquanto os irmãos nasceram com peso médio de 1,8 kg. Também foi o que ficou mais tempo internado na UTI neonatal, 45 dias, enquanto os irmãos tiveram alta com 20 e 30 dias. Com isso, passou a ser o mais protegido da família. "Por ser o mais pequenino, o que mais demandava cuidados e o que mais chorava, as pessoas tinham pena dele e o cercavam de atenção", relata o pai.
Atualmente, Lacerda diz que faz um revezamento com pais no acompanhamento de Gu nas sessões de terapia. E o trabalho já apresenta resultados. "Passamos a não nos preocupar mais com a fala dele. Voltamos a atenção para a nossa relação, que é a base da casa", diz Barros.
Mas os pais são unânimes em apontar progressos do menino, tanto na fala como de comportamento. "Ele se soltou. Além de se fazer entender melhor, está mais próximo ao pai. Antes, vivia agarrado a mim", conta a mãe.
(CLÁUDIA COLLUCCI)


Texto Anterior: Há 50 anos
Próximo Texto: Álbum de fotos reconta relação entre mãe e filha
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.