São Paulo, domingo, 16 de junho de 2002

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LEGISLAÇÃO

Projeto estabelece limites para ações indenizatórias, que neste ano aumentaram quase quatro vezes em relação a 99

Senado quer "tabelar" valor do dano moral

LUIZ CAVERSAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Para um dano moral "leve", a indenização será de até R$ 20 mil. O de natureza "média" poderá merecer até R$ 90 mil. E, se o dano for "grave", a indenização deverá ser de R$ 180 mil, no máximo.
Essa "tabela" para os processos em que se pede na Justiça reparação financeira por danos morais consta de um projeto de lei que tramita no Senado Federal. Segundo a proposta, as indenizações serão estipuladas por juízes, como já ocorre hoje, mas sem ultrapassar as quantias prefixadas.
A definição do que é dano moral e o valor exato das indenizações estão no substitutivo do senador Pedro Simon (PMDB-RS) a um projeto do senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE).
O texto foi aprovado na semana passada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado e aguarda para ser submetido ao plenário da Casa. Depois, vai para a Câmara dos Deputados.
A proposta dos senadores (veja quadro na pág. C3) ocorre em um momento em que se discute a multiplicação das ações por danos morais no Brasil, bem como os recorrentes pedidos de indenizações milionárias. Esse movimento já foi classificado por magistrados como uma "indústria de indenizações".
De acordo com os números do STJ (Superior Tribunal de Justiça), para onde converge esse tipo de ação, os processos se multiplicam a cada ano. Dispararam de 728 casos em 1999 para 1.348 em 2000 e para 1.666 em 2001. Até maio deste ano, já foram a julgamento nada menos que 1.152 processos, ou seja, quase quatro vezes a média mensal de três anos atrás.
Da mesma forma, têm sido frequentes os pedidos de indenizações exorbitantes. Exemplo recente mais notável é a sentença, emitida pela Justiça do Maranhão, favorável a um pedido de reparação moral no valor de R$ 258 milhões contra o Banco do Brasil, pela devolução indevida de um cheque de pouco mais de R$ 600. A decisão foi revista pelo STJ. Os ministros não só rebaixaram a indenização para R$ 3.600 como decidiram estabelecer um teto indenizatório de 500 salários mínimos para ações do gênero.

Cautela
O ministro do STJ César Asfor Rocha fez parte do grupo de magistrados que tomou a decisão. Ele entende a proposta de lei do Senado como uma tentativa de disciplinar a matéria, mas que deve ser avaliada com cautela.
"O problema é que não há critérios objetivos para quantificar o dano moral", afirma o ministro Asfor Rocha, 54. "Como estabelecer o que deve ser pago a quem perde um filho? E quem fica com sequelas de uma cirurgia plástica, ou sofre uma ofensa por intermédio da imprensa? Ou seja, o espectro é amplíssimo. Já é difícil especificar o dano, quanto mais o limite da indenização."
Asfor Rocha afirma que, pessoalmente, é favorável a que se estabeleça um limite, com a intenção didática de evitar abusos. "Mas a Constituição determina que a reparação deve ser ampla e total e, em alguns casos, poderá ser superior a R$180 mil." A solução seria uma "brecha" na legislação que contemplasse "as situações excepcionais" que merecessem indenização superior ao teto.

Pode valer a pena
A Constituição também é lembrada pelo juiz Marcos Vinícius Rios Gonçalves, 36, da 14ª Vara Cível de São Paulo. Professor de direito e autor de livros e artigos sobre o tema, ele considera inconstitucional o "tabelamento".
"A Constituição de 88 diz que a reparação deve ser integral. Portanto uma lei infraconstitucional não pode estabelecer um teto, uma compensação tarifada."
Além disso, Rios Gonçalves acredita que a fixação de um limite pode estimular a ação delituosa. "Alguém poderá considerar que vale a pena atacar a honra de outra pessoa, caluniar, sabendo que correrá o risco de pagar determinada quantia caso venha a ser condenado."



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