São Paulo, domingo, 16 de julho de 2006

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Para analistas, PCC calculou dano político

Pressionados por ano eleitoral e por pânico da população, políticos ficam mais suscetíveis às exigências dos criminosos

Proximidade das eleições faz criminosos pensarem em barganha maior em negociações com o poder público, dizem especialistas

RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Para quatro diferentes especialistas em segurança pública ouvidos pela Folha, é razoável supor que o PCC (Primeiro Comando da Capital) leve em conta uma variável política ao promover ataques urbanos análogos a atos de terror.
O período eleitoral, dizem analistas ligados a instituições de São Paulo, Rio e Minas, torna o poder público e os políticos mais frágeis ao pânico causado na população pelos bandidos -que teriam mais margem de barganha para seus pleitos.
"Ninguém tem uma resposta definitiva", diz Denis Mizne, diretor-executivo do Instituto Sou da Paz, quando questionado sobre a razão de ataques públicos e a promoção de pânico na população e o que o PCC teria a ganhar com isso. "Mas parece fazer sentido que estejam aproveitando um momento de fragilidade do poder público."
Entre os fatores componentes dessa fragilidade, cita o fato de o atual governador de São Paulo, Cláudio Lembo (PFL), ser um substituto, não eleito, em fim de mandato, e a proximidade das eleições. "Tentam usar o momento para ganhar regalias. O momento eleitoral é frutífero para se botar pânico nas pessoas. Os políticos respondem como barata tonta. Nessa época, são mais vulneráveis à reação da população."
Dessa forma, explica, os líderes do PCC teriam mais facilidade de tentar impor o que desejam, o que leva à razão primordial da reação e dos ataques. "Em nenhum lugar o crime organizado se mexe e ataca se está tudo bem", diz Mizne. O que está mal agora para o PCC, ele diz, são as transferências para prisões e regimes mais duros e que dificultem a comunicação com o mundo exterior.
Cláudio Beato, do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública, ligado à UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), diz que os ataques do PCC "aumentam o poder de barganha e desmoralizam o poder público". "Faz sentido a oportunidade do momento eleitoral."
Luiz Eduardo Soares, ex-secretário nacional de Segurança Pública, hoje candidato a deputado federal pelo PPS-RJ -aliado nacional do PSDB na candidatura de Geraldo Alckmin à Presidência-, disse "que a intervenção do PCC tem propósito político claro".
"O PCC é um instrumento de intervenção no espaço público que usa a política como arma no benefício de seus próprios interesses", diz Soares.
"Utiliza-se do que a ciência política chama de "spoiling power", o poder de destruir", para "desconstituir o poder do Estado e a candidatura Alckmin".
Soares compara o que ocorre hoje em São Paulo com o uso desse mesmo "poder de destruir" como arma de barganha no Rio, em 2002, quando o tráfico determinou o fechamento de estabelecimentos comerciais em toda a cidade seis dias antes das eleições -foi uma represália ao isolamento dos líderes do Comando Vermelho.
A visão dos quatro analistas é compartilhada, de maneira menos peremptória, por Marcelo Lopes de Souza, coordenador do Núcleo de Pesquisas sobre Desenvolvimento Sócio-Espacial, da UFRJ. Ele diz que o uso da variável política, da oportunidade eleitoral, pelo PCC é "plausível".
Segundo ele, é razoável supor "alguma sofisticação de raciocínio e planejamento" por parte dos líderes do PCC, o que incluiria a consciência da dimensão política nos ataques.


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