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ÁREAS PÚBLICAS
Sob ameaça de processo, prefeitura tenta, com quatro meses de atraso, receber por uso de terrenos do município
Pressionada, Marta cobra aluguel de clubes
SÍLVIA CORRÊA
DA REPORTAGEM LOCAL
A Prefeitura de São Paulo notificou 15 entidades instaladas sobre
terrenos públicos para negociar
algum tipo de contrapartida pelo
uso dessas terras. Esses particulares mantêm seus negócios sobre
áreas municipais há décadas,
dando em troca pouco ou literalmente nada ao governo.
Dez deles são tradicionais clubes privados (veja quadro). Para
continuarem nessas áreas, eles terão que pagar à prefeitura o que
seria o aluguel de mercado dos
terrenos que ocupam ou oferecer
uma quantidade de serviços que
corresponda a esse valor. Em alguns casos, porém, a ocupação é
tão irregular -além de barata,
não gerou as obras combinadas- que as áreas terão de ser retomadas pelo governo.
As reuniões entre a prefeitura e
as entidades começaram na semana passada e terminarão no final de outubro. Será a única rodada de negociações amigáveis.
As áreas em questão foram parar nas mãos de particulares ao
longo dos últimos 30 anos, por
leis de concessão ou decretos de
permissão de uso.
A cessão gratuita ou por contrapartidas irrisórias para entidades
que não são filantrópicas nem beneficentes faz com que o interesse
público -exigência da legislação
para essas ações- seja questionável, além de levar ao enriquecimento indevido de particulares.
A falta de interesse público é o
que acontece, segundo a Promotoria, no caso que envolve o São
Paulo, por exemplo. O clube fez o
CT da Barra Funda sobre uma
área municipal que vale mais de
R$ 22 milhões. Em contrapartida,
tem só de ceder as instalações para os alunos da rede municipal.
Mas, em carta, a Secretaria da
Educação informou que não tem
interesse em manter essa cessão.
A falta de interesse público e o
enriquecimento dos particulares
em detrimento da municipalidade são, na opinião do Ministério
Público, duas das quatro ilegalidades que permitem à prefeitura
renegociar e até retomar as áreas.
Além de as concessões terem sido feitas sem concorrência, muitos dos concessionários descumpriram as obrigações previstas
em contrato. É o caso, por exemplo, do Corinthians, que ocupou
a maior área pública hoje nas
mãos de terceiros para fazer um
estádio de futebol que até hoje
não existe.
Juntas, as 15 entidades notificadas pela prefeitura ocupam 590,9
mil m2 de área. Se pagassem aluguel, a prefeitura teria por ano
mais R$ 19,88 milhões.
Relatório publicado este ano no
"Diário Oficial" relata 213 áreas
cedidas: 102 permissões gratuitas
e 39 onerosas -por tempo indeterminado- e 72 concessões que
chegam a durar 99 anos.
Ao todo, é 1,42 km2 -cinco vezes a área do complexo do Carandiru e quase o dobro do que ocupam os 39 empreendimentos do
Projeto Cingapura. Poderiam
render por ano R$ 47,78 milhões
em aluguel ao município (cerca
de 8% do valor total dos imóveis),
dinheiro suficiente para atender,
durante um ano, 33 mil famílias
no Programa Renda Mínima.
O relatório mostra que os governos que mais entregaram
áreas públicas a terceiros foram
os de Jânio Quadros (1986-1988) e
de Paulo Maluf (1993-1996) -50
e 36, respectivamente.
Inédita e tardia
A tentativa de negociação encabeçada pelo governo petista de
Marta Suplicy é inédita, mas começa com quatro meses de atraso
em relação ao prazo legal.
Denunciada por uma reportagem da Folha, a cessão irregular
das áreas públicas foi alvo de uma
CPI na Câmara Municipal.
Concluída em 4 de outubro do
ano passado, ela analisou cerca de
140 casos e deu 180 dias para o
Executivo iniciar a revisão das
contrapartidas e o processo de
reintegração de posse de algumas
áreas. O prazo terminou em abril.
Em 25 de julho, a Promotoria
de Justiça da Habitação oficiou a
prefeita para que explicasse o que
havia feito, sob pena de ser processada por improbidade administrativa (má gestão pública).
Em 23 de agosto, a prefeitura notificou as primeiras 15 entidades.
A prefeitura nega ter agido apenas depois de pressionada e diz
ter usado os dez meses para traçar
uma política de ocupação das
áreas, mas admite que, em uma
negociação politicamente delicada, está usando a ameaça de processo como força de persuasão.
"São centenas de cessões nas últimas décadas. Não se pode imaginar que 180 dias seja prazo suficiente para solucionar um problema de 30 anos", diz a secretária municipal dos Negócios Jurídicos, Anna Emília Cordelli Alves.
Veja a lista de todas as áreas municipais cedidas
a terceiros na Folha Online
www.folha.com.br/022551
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