São Paulo, segunda-feira, 17 de janeiro de 2005

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Tribos comportamentais dividem as praias do Rio

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

No mapa das praias cariocas, os jovens ricos que exibem seus corpos malhados em frente ao Country Club, no final de Ipanema (posto 10), estão geograficamente muito mais próximos dos banhistas da Cruzada São Sebastião, conjunto de classe baixa do início do Leblon, do que da juventude classe média e alternativa que predomina nas areias do meio de Ipanema (posto 9).
Apesar da violência da cidade, do medo de arrastões, dos carros blindados e prédios gradeados em que as elites cariocas se escondem, as praias insistem em ser o espaço mais democrático do Rio.
"Aqui é todo mundo igual. Eu não paguei, ninguém pagou", diz uma personagem do documentário "Faixa de Areia", dirigido por Flávia Lins e Silva e exibido pelo canal pago GNT. O programa mostra como a praia permite essa mistura social, ao mesmo tempo em que estabelece fronteiras culturais ou comportamentais. São as chamados tribos, que delimitam seus espaços na areia.
"No [posto] 9 está difícil de ir porque está muito muvucado [cheio]. No 10 só tem patricinha, parece desfile de moda: tem menina que vai até de salto alto para a praia. Então, a gente fica no 9 e meio, que é mais eclético e tranqüilo", delimita com rigor a estudante de jornalismo Renata Porto, 21, ao lado de três amigas.
O 9 e meio reúne o público que marcou o antigo 9: jovens -e ex-jovens com espírito de Peter Pan- que passam horas sentados numa canga, não ligam para grifes de biquíni, batem palmas para o pôr-do-sol e, em boa parte, fumam maconha na areia.
Foi no 9 que se consagraram o verão da lata (1988), quando 22 toneladas de maconha se soltaram do navio Solana Star e algumas latas deram no litoral carioca, e o verão do apitaço (1995), quando apitos soavam na praia para alertar os fumantes da chegada da polícia.
"O bom aqui é que você sempre encontra alguém conhecido. E já dá para marcar o que fazer à noite, porque as pessoas gostam dos mesmos lugares: Santa Teresa, Lapa e, principalmente, Baixo Gávea", diz a estudante de nutrição Jessica Nobre, 22, traçando o circuito da juventude alternativa, que prefere barzinhos a boates.
Entre os postos 9 e 10, é possível se deparar com Luana Piovani, Guilherme Leme, Victor Fasano e outros atores. Já entre os postos 8 e 9, em frente à rua Farme de Amoedo, o ponto é notoriamente gay, ocupado por casais, grupos e turistas. O estilista Calvin Klein passou ali a maior parte do tempo em que esteve na cidade.
Os adeptos do turismo sexual preferem, em Ipanema, a faixa de areia em frente ao Ceasar Park. Em Copacabana, o ponto da prostituição é diante do Othon Palace, enquanto a praia em frente ao Copacabana Palace tem até a bandeira com as cores do arco-íris que identifica áreas gays.
A Barra da Tijuca já deixou há muito tempo de ser opção para quem quer sossego. Especialmente depois da abertura da Linha Amarela, gente de toda a cidade tem chegado ao antigo santuário dos ricos emergentes.
"Gosto daqui porque tem sempre gente bonita e alegre", simplifica a pedagoga Jeane Elizabeth, 30, pegando sol em frente à barraca do Pepê, a mais famosa da Barra. "Quando o Pepê enche muito, como tem acontecido, prefiro ir um pouco para o lado", afasta-se a psicóloga Mariana Alves, 29.
Essa busca por sossego leva muitas pessoas à Joatinga, praia com apenas 200 m de areia e difícil acesso, e à Prainha, a preferida dos surfistas. "Aqui é muito mais tranqüilo e dá até para ele aprender surfe", diz a vendedora Fabiana Fontenelle, 25, apontando para o filho Breno, 6, que já sobe na prancha com a ajuda dos pais.
Mesmo sendo área de proteção ambiental, Grumari, vizinha da Prainha, já é um programa inviável nos fins de semana, dado o excesso de banhistas e carros. Quem quer sossego nos sábados e domingos tem de se aventurar por searas mais distantes.


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