São Paulo, terça-feira, 17 de fevereiro de 2004

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ABASTECIMENTO

Para Instituto Socioambiental, nível do sistema Cantareira estaria em 34% se produção tivesse sido reduzida em 10%

Economia contínua desde 2001 teria evitado crise

MARIANA VIVEIROS
DA REPORTAGEM LOCAL

Se desde 2001, quando os reservatórios do Cantareira deram os primeiros sinais de crise, o governo do Estado tivesse reduzido em 10% a produção de água no sistema, os cerca de 9 milhões de moradores da Grande São Paulo por ele abastecidos não estariam agora sob ameaça de racionamento.
Isso porque, com a "economia" contínua, o Cantareira estaria funcionando hoje com cerca de 34% de sua capacidade operacional, e não 6,5% (índice de ontem). Poderia também chegar com 50% em abril e terminar o período seco (agosto) com cerca de 40% -se mantidos o consumo e o volume de precipitações de 2003, que foram abaixo da média-, um índice bastante confortável.
A diminuição na produção não precisaria ter sido feita por meio de rodízio, ou seja, a população atendida não teria sofrido falta de água -o que agora deverá ser inevitável, segundo especialistas e o próprio governo. Ela teria sido possível pela transferência de parte das regiões abastecidas pelo Cantareira para os sistemas Alto Tietê e Guarapiranga.
Isso foi progressivamente feito a partir de agosto de 2003, quando a Sabesp (empresa de saneamento do Estado) percebeu que o maior sistema da Grande SP tinha pouco mais de 21% da capacidade.
Até janeiro deste ano, a medida conseguiu manter 4,2% de água a mais no Cantareira, segundo Amauri Pollachi, gerente de controle do abastecimento da Sabesp. Mas foi adotada tarde demais, avalia Marussia Whately, pesquisadora da área de recursos hídricos do Instituto Socioambiental (ISA) e autora das projeções, que têm base nas estatísticas da própria companhia de saneamento.
Agora, diz Whately, o sistema não ficará numa situação tão boa mesmo com o racionamento de março a junho -como o previsto pelo secretário de Estado de Energia, Recursos Hídricos e Saneamento, Mauro Arce- atingindo 6,5 milhões de pessoas, a serem divididas em três grupos, que ficariam sem água, um de cada vez, por entre 24 e 36 horas.
"Considerando que a economia causada pela redução da produção e as chuvas de fevereiro podem elevar o índice de armazenamento do Cantareira para 12%, e que a quantidade economizada de água com a adoção do racionamento seja de 11 mil litros por segundo [mais ou menos 1/3 da produção], é possível que o nível de 35% seja atingido em julho", diz a pesquisadora. Isso seria menos do que o registrado em julho de 2002 (49,6%) e só cerca de 1/4 a mais do que a capacidade do sistema em julho passado (27,7%), quando a crise já se avizinhava.

Proteção e fé
Para Whately, projeções mostram que "a melhor forma de proteger a população da falta de água é proteger, ao máximo, os sistemas produtores de um colapso". Para ela, o gerenciamento dos recursos hídricos virou uma "questão de fé" nas chuvas.
"O governo argumenta que a decisão de não fazer ainda o racionamento é técnica, e não política, mas, há algum tempo, a única coisa que os técnicos fazem é olhar para o céu em busca de chuva e contar os dias. E estamos num ano eleitoral", afirma.
A previsão de um colapso do sistema na estação seca também é preocupação da Agência da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, sobre a qual está a Grande São Paulo. "O racionamento é inevitável", afirma o presidente da entidade, Júlio Cerqueira César Neto.
A agência divulgou, no fim de janeiro, uma carta na qual afirma ser "gravíssimo" o quadro do sistema Cantareira e diz que a população precisa saber disso para se conscientizar, evitar desperdícios e reduzir o consumo de água.
Para Whately, a única saída para o Cantareira seriam campanhas "mais radicais" de redução do consumo. "Buscar novos mananciais não é a opção mais sustentável. Construir novas represas não é um processo que dure menos de dois anos."
A Sabesp afirma que está praticamente descartado o racionamento neste mês.


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