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POLÍCIA FORA DA LEI
Acusação do Ministério Público atinge 13 ex-integrantes do grupo, extinto após ações ilegais contra o PCC
PMs do Gradi são denunciados por tortura
ALESSANDRO SILVA
GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL
O Ministério Público de São
Paulo denunciou ontem 13 policiais militares, entre eles um tenente-coronel e um tenente, pelo
crime de tortura. Todos faziam
parte do extinto Gradi (Grupo de
Repressão e Análise dos Delitos
de Intolerância), que, entre julho
de 2001 e abril de 2002, recrutou
ilegalmente presos em penitenciárias do Estado para infiltrá-los
em supostas quadrilhas ligadas à
facção criminosa PCC (Primeiro
Comando da Capital).
É a primeira acusação formalizada pela Promotoria em um ano
de investigações contra homens
dessa unidade, que serviu como
principal aparelho de repressão
do Estado ao crime organizado e
que chama a atenção pelo número de mortes -27 em cinco operações. As ações suspeitas do Gradi foram reveladas pela Folha em
julho do ano passado.
A pena para o crime de tortura,
em caso de condenação, pode
passar de dez anos se forem aceitos todos os argumentos da acusação. Cinco promotores assinam
o documento encaminhado ontem para a Justiça estadual.
Em outro procedimento sobre
as ações do grupo de inteligência
da PM, que está sob sigilo no Tribunal de Justiça, o atual secretário
da Segurança Pública do Estado,
Saulo de Castro Abreu Filho, e
dois juízes são investigados a pedido do procurador-geral de Justiça, Luiz Antonio Guimarães
Marrey. Pelo cargo, os três têm direito a foro privilegiado.
A Justiça irá decidir agora se
aceita ou não a denúncia do Ministério Público para processar os
13 policiais e o preso Marcos Massari, um dos condenados recrutados pelo Gradi. Todos teriam participado de alguma forma no espancamento dos detentos Ronny
Clay Chaves e Rubens Leôncio
Pereira, em 31 de março do ano
passado, na capital.
A história começa um dia antes
na sede do 1º Batalhão de Choque
da Polícia Militar, no Brooklin
(zona sul de SP). Os presos Chaves e Pereira, retirados pelo Gradi
de uma penitenciária com ordem
judicial, receberam um carro
"frio" e um celular da polícia para
ir a uma reunião em que supostos
assaltantes planejariam o roubo a
um hotel no litoral.
No meio da operação, porém,
eles enganaram os dois PMs que
os acompanhavam em outro veículo descaracterizado e fugiram
no carro da corporação.
No dia seguinte, com a ajuda de
outro recrutado, Marcos Massari,
os policiais do Gradi localizaram
os foragidos em uma casa na zona
sul da capital. Segundo a Promotoria, "apesar de não oferecerem
nenhuma resistência, as vítimas
foram violentamente agredidas e
submetidas a intenso sofrimento
físico, com chutes e socos".
Pereira, apanhado no segundo
andar do sobrado, teria sido jogado de uma janela, fraturando o fêmur na queda. Apesar disso, conforme a denúncia, continuou a ser
agredido pelos policiais.
O outro detento, Chaves, detido
no banheiro da casa, teria sido jogado de uma escada e espancado,
sofrendo ferimentos pelo corpo,
de acordo com laudo médico.
Seis PMs são acusados de participar diretamente das agressões
durante a prisão: o sargento Hélio
Soares, o soldado Paulo Sérgio de
Oliveira, o sargento João Carlos
Salatiel, o sargento Rodney Carmona, o soldado José Fernandes
de Lima e o subtenente Hamilton
Oliveira de Morais.
Outros seis teriam presenciado,
agredido ou incentivado: o tenente Henguel Ricardo Pereira, o cabo Francisco Alexandre Filho, o
sargento Everaldo Borges de Souza, o soldado Marco Antonio Gomes Dias, e os sargentos Eduardo
Souza Izabo e Eduardo Nelson
Parra Marim. O preso Massari estaria nesse grupo.
Após a detenção, Pereira foi levado até um pronto-socorro, pois
estava com a perna fraturada, enquanto Chaves seguiu para a sede
do 1º Batalhão de Choque -base
do Gradi. Lá, teria sido algemado,
agredido -inclusive por Massari- e trancado por quase uma
hora, sob sol forte, no compartimento de presos de um carro.
O último PM denunciado, o tenente-coronel Roberto Mantovan, na época coordenador do
Gradi, "estava na sala ao lado, ouvia os gritos de socorro da vítima,
mas não interveio, permitindo
que o suplício se estendesse por
significativo período de tempo,
apesar de ter o dever jurídico de
coibir e apurar" o caso, segundo o
texto da denúncia da Promotoria.
Ontem, o tenente-coronel, que
passou para a reserva há três meses, negou a acusação. "A realidade é totalmente diferente da versão contada pelos presos", disse.
A Folha não conseguiu localizar
os outros policiais denunciados,
mas teve acesso ao depoimento
deles durante a fase de inquérito. Todos
negaram as acusações de tortura.
Polícia e Promotoria afirmam
que a demora para se fazer a denúncia ocorreu por causa do envio do inquérito para o Tribunal
de Justiça, em agosto do ano passado, por causa da suposta ligação
dos juízes e do secretário com
ações do Gradi. Em março, o caso
de tortura retornou para a polícia
por determinação do TJ e foi encerrado há duas semanas.
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